segunda-feira, 14 de maio de 2012


Todo livro permite a contingência de equívocos e omissões, notadamente quando se trata de uma obra de genealogia.
Tive a grande satisfação de comparecer ao lançamento do livro "MOURA e RAPOSO DA CÂMARA NO RIO GRANDE DO NORTE-Ascendência & Descendência: Colônia, Império, Regência e República", excelente trabalho da autoria do Engenheiro MARCO AURÉLIO DA CÂMARA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, filho do meu saudoso Professor FLORIANO CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE.
Pois bem, após fazer a sua leitura, deparei-me, na página 326, com alguns dados que merecem reparo: o autor, ao mencionar o meu avô Jerônimo Xavier, informa que o mesmo gerou, com D. Aline Albuquerque Maranhão uma prole de quatro filhos. Contudo enumera somente três - Lígia, minha mãe, e as tias Elza e Maria de Lurdes, esquecendo da quarta, Maria da Cruz, ou "Cruzinha", que foi casada com João Batista, com quem teve as filhas Maria das Graças e Maria de Fátima.
Quando menciona os filhos de Lígia, na verdade, Maria Lígia, relacionou os filhos gerados com o Desembargador José Gomes da Costa, omitindo outros dois filhos que faleceram em tenra idade: Therezinha e João e, ao mencionar o meu nome o faz como Carlos Alberto, quanto na verdade sou Carlos Roberto e tenho um filho e um neto com o mesmo nome.
Completa a retificação e o acréscimo, gostaria de apresentar uma homenagem que fiz ao Desembargador e Professor Floriano Cavalcanti de Albuquerque, que não foi referida no livro, embora publicada na Revista UnP/Jurídica v.2, n.1, de jan/jun.2000. Eis o texto:
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FLORIANO CAVALCANTI, o filósofo da Província

“A federalização da magistratura, unificada e regida por uma lei única de organização judiciária, é imperativo da evolução político-jurídica brasileira. Não se compreende mais o pluralismo da Constituição de 1891. Talvez que àquele tempo se justificasse, em virtude mesmo da passagem brusca do unitarismo imperial para o federalismo republicano. Seria uma transição de regime. Mas hoje, que passou a obsessão descentralizadora, em que tanto o direito material como o formal, ali atribuídos, separadamente, um à União e o outro aos estados-membros, já são da exclusividade da União, não há mais lugar para essa dualidade de justiças, com juízes federais e estaduais, e multiplicidade de organizações judiciárias, que dão antes a impressão de uma Confederação de Estados do que de uma Federação.”

Essa arrojada tese, apresentada à II Conferência Nacional de Desembargadores, realizada em Salvador-Bahia, no ano de 1962, já denotava o avanço na busca da Justiça ideal, que tinha uma justificação jurídico-filosófica, assim posta:

“... o argumento que ainda se repete contra a unidade da Justiça, é o de uma pretensa incompatibilidade com o regime federativo. Derivaria do falso conceito da escola de CALHOUN, de uma soberania dupla, que não encontra mais guarida nem mesmo nos Estados Unidos da América do Norte, donde foi transplantado. Já não se confunde mais soberania com autonomia, por ser a summa potestas do Estado independente, una e indivisível. Numa federação, que se caracteriza pela união de Estados, pertence, exclusivamente, ao Estado síntese, e não aos Estados-membros, que são apenas autônomos. Logo, nenhuma incompatibilidade no fato de ser a Justiça uma só, no Estado federado, máxime quando já se acha unificado todo o Direito, quer substantivo, quer adjetivo.”

Esta é uma singela prova da exuberância do conhecimento do nosso homenageado, Paraense de Belém, nascido no crepúsculo do Século XIX, aos 10 de dezembro de 1895, FLORIANO CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, filho do casal Capitão Pedro Cavalcanti de Albuquerque e Eulália Cavalcanti de Albuquerque, seria na Província de Natal o seu mais festejado filósofo, apontado como paradigma de cultura no nosso Estado, transpondo nossos limites nas regiões Norte e Nordeste deste imenso Brasil.

Após estudos regulares, obteve o grau de Bacharel pela tradicional Faculdade de Direito do Recife - 1918, sob o clamor ainda, das Polêmicas de Tobias Barreto, dos poemas de Castro Alves e das discussões civilistas que geraram o Código Civil brasileiro, na doutrinação imorredoura de Clóvis Beviláqua e Ruy Barbosa.

Seu talento logo se faria presente, quando obteve o laurel de Professor de Lógica, Fisiopsicologia e História da Filosofia do Atheneu Norteriograndense, em 1919 e no mesmo ano, Catedrático de História Universal. Chegou a dirigir a Escola de Aprendizes Artífices, instituição exemplar, ainda hoje reconhecida e consagrada - atual CEFET.

Como todo idealista, passou pela política na condição de Deputado Estadual no período 1925/1928 e na Constituinte de 1926, chegando a comandar o Partido Republicano de 1925 a 1929.

Seu pendor pelas letras jurídicas o fez ingressar na Magistratura em 1930, iniciando pela longínqua Comarca de Pau dos Ferros, removido em 1931 para Canguaretama (Penha) e em 1934 promovido para Natal, onde assumiu a 1ª Vara.

Foi Juiz do Estado de Sítio - de fevereiro de 1935 a março de 1936.

Em junho de 1941 nomeado Desembargador do nosso Tribunal de Justiça, empossado em 14 de junho, de onde viria a ser Presidente em 8 de dezembro de 1954 e, como membro do Tribunal Regional Eleitoral, onde ocupou todos os cargos daquela Corte Especial - Corregedor, Vice-Presidente e Presidente em novembro de 1946. A propósito, presidiu a reabertura desse Tribunal por força do Decreto nº 7.586, de 28 de maio de 1945, na histórica sessão do dia 12 de junho do mesmo ano, pelas 14 horas, no Plenário do Tribunal de Justiça, em substituição ao Desembargador Miguel Seabra Fagundes, que se encontrava em viagem oficial à então Capital da República, registrando-se as presenças dos eminentes juristas Eurico Soares Montenegro, Carlos Augusto Caldas da Silva, José Áureo Lins Bahia e Raimundo Macedo, na condição de Procurador Regional Eleitoral, tendo como Secretário da reunião o Bacharel Carlos Roberto de Oliveira. Aposentou-se para viabilizar sua candidatura a Governador do Estado pelas Oposições Coligadas, período de apaixonada campanha política, da qual não logrou êxito, retornando à Magistratura, uma vez que anulada sua aposentadoria, prestando novo compromisso em 30 de janeiro de 1951, retomando o brilhantismo dos seus votos, como já o fizera nas sentenças, quando juízo monocrático.

Pelo seu reconhecido saber, foi o 1º Titular da Cátedra de Introdução à Ciência do Direito da tradicional Faculdade da Ribeira, da qual foi Diretor em 11 de novembro de 1950 e ali lecionou até 1965. As suas aulas eram repletas de assistentes, inclusive de outras turmas, sempre terminando sob aplausos, mercê da constante empolgação com que ministrava suas lições - “Quem desconhece a filosofia não poderá ter alcance dos vôos cosmológicos dos condores, mas apenas dos rasteiros dos galináceos”.

Conferencista requisitado, deixou várias peças escritas de inestimável valor, entre as quais os seus biógrafos registram algumas:

Antônio Marinho e o seu tempo (discurso sobre o patrono da cadeira 21, que assumiu na Academia Norte-Rio-Grandense de Letras);
Amaro Cavalcanti, o homem e o jurista;
Clóvis Beviláqua e sua concepção jurídico-filosófica;
Nacionalização da Justiça;
Caxias, o estadista-soldado;
Pessimismo sob o conceito universal;
Juizes e Advogados;
Da responsabilidade civil do Estado;
Rui Barbosa e a necessidade do Culto Cívico;
Silvio Romero, o crítico, o filósofo e o jurista;
O juiz e a importância de sua missão;
A concepção filosófica da história;
Tobias Barreto e a Escola do Recife;
Farias Brito e sua influência espiritualista.

O homenageado pertenceu à Associação dos Magistrados do Rio Grande do Norte, a qual presidiu em 1954, foi da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, Diretor da Revista do Tribunal de Justiça em 1955.

Seu falecimento ocorreu nesta Capital em 7 de outubro de 1973, aos 78 anos de idade, quando ainda gozava de lucidez e muito tinha a doar de sua invejável inteligência, incontestavelmente empobrecendo o Estado que, de coração nomeou como seu e preserva a sua memória.

Sua importância para o Rio Grande do Norte bem se pode aquilatar, quando foi biografado pelos potiguares de maior realce deste Século:

LUÍS DA CÂMARA CASCUDO, assim proclamou o nosso homenageado: “Magistrado, filósofo, sociólogo, político, advogado, orador, conferencista, professor.” (discurso proferido em 23/3/1950 - ANL);

OTTO DE BRITO GUERRA: “Ressaltou a sua integridade de magistrado e à fé cristã, repudiando o materialismo estéril, onde o Sermão da Montanha era seu livro de cabeceira.” (discurso proferido em 1974);

JOÃO MEDEIROS FILHO (também potiguar por adoção): “Seus estudos jurídicos, em linguagem escorreita, denunciam o profundo conhecedor da Ciência do Direito. Proferiu sentenças que, a par dos aspectos dogmáticos, da pesquisa teórica e da formulação das doutrinas, revelam a segurança do sociólogo na observação dos fatos.” (livro Contribuição à História Intelectual do Rio Grande do Norte, Natal, 1983);

Seu mais recente biógrafo é o jovem EDUARDO ANTÔNIO GOSSON, no livro Sociedade e Justiça. Natal, DEI, 1998.

Não poderia deixar de enaltecer a lembrança da Universidade Potiguar, em parceria com a Direção do Curso de Direito, da Coordenação de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão e do Centro Acadêmico Seabra Fagundes em conferir à VIII Semana de Estudos Jurídicos o nome do "Desembargador Floriano Cavalcanti", justo preito a um homem que outra coisa não fez do que buscar um futuro melhor dentro do aperfeiçoamento do Estado de Direito e, ao mesmo tempo, agradecer a honra do convite para ser o porta-voz desta homenagem, para mim um verdadeiro presente; uma alegria incontida; uma emoção só justificável aos seus ilustres descendentes que aqui estão. Privei da amizade do Estimado Mestre, como aluno e na convivência fraterna que tinha com o meu pai - Desembargador José Gomes da Costa, tendo freqüentado a sua casa algum as vezes, quando até recebi uma de suas obras autografada.

Esta é também a minha segunda homenagem pública ao pranteado Jus-filósofo da velha Faculdade da Ribeira. Já o fizera ao publicar o ensaio “Algumas Considerações sobre o Direito e a Norma” - Revista Paradigmas - Série Jurídica, v. 10 n. 7 - jan/mar/1998 - UnP.

Abraçando seus descendentes, agradeço a atenção de todos e, em especial à mocidade aqui presente, pedindo que continue a resgatar o nossos valores do passado, pois sem eles, não haveria futuro. FLORIANO CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE é nome para se guardar ad perpetua memoria.

OBRIGADO.

Professor CARLOS ROBERTO DE MIRANDA GOMES,
Bacharel da Turma de 1968 - 10ª da UFRN.

Natal, em 07/10/1999
(Publicado na Revista UnP/Jurídica, vol.2, nº 1- jan/jun 2000)



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