segunda-feira, 25 de abril de 2011
RÉQUIEM PARA UM ESTÁDIO (*)
Sob o impacto da manchete de O Jornal de Hoje, edição de 23/24 deste abril: “O último suspiro”, já recolhido à meditação da Semana Santa, ainda mais voltei no tempo e me deparei com o desamor, com a insensatez e com a falta de vontade política para atender às necessidades do povo, que ainda persiste nestas plagas de Poti.
A imprensa vem alardeando o fechamento de hospitais infantis em Natal e Parnamirim, a falta de medicamentos, a insegurança, escola caindo, ruas alagadas, transporte precário, ganância de alguns postos de combustíveis, falta de fiscalização, constatação do caos nos hospitais e estabelecimentos prisionais, estradas e ruas esburacadas. Ao reverso, os políticos especulam o próximo titular da Prefeitura de Natal, os burocratas que já atuaram ou atuam nos palcos da província, sem nada de novo, sem proposta e sem projetos públicos estruturantes, mas apenas os da sobrevivência das oligarquias.
Enquanto isso acontece, são contadas as horas da demolição de um bem público que somou grandes feitos, que alegrou a população mais desprovida de recursos, que ofertou momentos de glória.
Num passe de mágica, tudo isso é passado, não o passado que fica, mas o que se esquece. Alguns cronistas especializados registram o fato como algo comum – Machadão com dias contados - e até relacionam minúsculos acontecimentos negativos como brigas, suicídios, crimes ou quedas fatais em simetria com conquistas. Mas apontam lenitivos - a destruição é sem implosão para não incomodar os vizinhos. Já se comenta como ex-colosso.
Há uma canção que retrata bem esse episódio: “Nossa história acabou, sem um aplauso sequer, quando o pano baixou, uma cena banal, mas um ponto final”.
Sim, o Machadão vai ao chão, foi condenado sem nenhuma defesa, a não ser o grito de um vetusto arquiteto que o concebeu e o apoio de poucos amigos. Os órgãos públicos pouco fizeram; audiências frustradas por orquestrações exóticas, inúteis – somente para seguir o figurino.
Muitos pais e mães se apresentaram para a nova Arena do Futebol, chamada das Dunas e até usaram como argumentos de campanha política. Esqueceram-se, porém, que, de certa forma condenaram o próprio esporte bretão. O América e o Alecrim ameaçam licenciamento, e será que o ABC terá como sobreviver sozinho?
Não sei realmente, mas pressinto que alguma coisa de ruim vai acontecer e justifico: primeiro um julgador declarou improcedente ação do Ministério Público porque entre o tempo do ajuizamento e o seu julgamento o megalomaníaco projeto foi modificado – não mais atingiria outras áreas (o Centro Administrativo, por exemplo), mas somente os Estádios Machadão e Machadinho, sem atentar que o questionamento era em razão da ilegalidade da contratação, sem licitação, para um projeto que não existia e sim uma simples maquete. Mesmo assim o prazo de recurso foi perdido. Aliás, tudo começou com um parecer de um jurista do Estado, que hoje está no píncaro da glória.
Depois disso, dirigentes declararam que a FIFA e a CBF não condicionam, necessariamente, a realização da copa em Natal à complementação do aeroporto de São Gonçalo do Amarante e de obras de mobilidade urbana. Em outras palavras, em relação a isso podemos mesmo continuar na “m”.
E se a coisa der errado, quem vai assumir? Qual o discurso já preparado para o insucesso? E o povo vai deixar impunes esses visionários?
Vão aprendendo logo a música de Chico Buarque sobre o destino da Geni.
Enquanto isso, constrangidamente faço o meu “Réquiem para um Estádio”:
Um dia, numa tarde - a grande festa.
A cidade se engalanava, em fantasia.
O povo, na sua incontida alegria,
Fazia um coro, como uma grande orquestra.
O tempo passa, a festa acaba – desilusão.
Momentos lúdicos ficam pra traz, sem constrangimento.
O povo, na sua infinita letargia, aplaudirá novo momento,
Da cruel, incontornável e definitiva demolição.
Não há certeza, se por algum milagre,
Um novo poema de concreto surja na cidade.
Se o povo, em dia de alegria, ainda poderá sentir,
O sabor de um gol perfeito de um Alberi.
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(*) CARLOS ROBERTO DE MIRADA GOMES – escritor
Fonte: Blog DO MIRANDA GOMES
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(RESPOSTA DE MOACYR)
O TÚMULO DE MINHA ÚLTIMA QUIMERA
Querido irmão Carlos:
Li emocionado seu texto sob o título “RÉQUIEM PARA UM ESTÁDIO”, no qual, mais uma vez me oferece seu ombro amigo para mitigar as inevitáveis dores do existir. Por mera carência intelectual, permita-me lembrar os “Versos íntimos” de Augusto dos Anjos, como forma de lhe agradecer tão generosa e oportuna solidariedade, uma vez que, em minha opinião, ninguém conseguiu pintar com tanto realismo a verdadeira natureza humana, quanto àquele grande vate paraibano.
O quadro que você expôs em prosa, teve a força de impacto da Guernica de Picasso. Estou certo que a maior parte das pessoas lúcidas e sensatas desta comunidade repudiam esta ignomínia que estão praticando contra o povo potiguar, justamente através das pessoas que o povo elegeu para governá-lo, só que não podem se manifestar publicamente, por temor às possíveis represálias do “sistema”.
Neste final das comemorações da Páscoa, é lamentável ter que reconhecer que os exemplos de Cristo, pouco sensibilizaram os humanos, que, cada vez mais se tornam predadores de si mesmos. Tudo que pude dizer sobre essa bandalheira da Copa 2014, já foi dito, como advertência, e de nada serviu, só restando agora esperar o milagre do tal “legado” prometido.
Ao afastar-me da luta desigual, registro com indignação, que esse assalto ao erário e ao patrimônio público, planejado e anunciado há muito tempo, iniciado por governo com extensa lista de improbidades denunciadas e investigadas, veio a tornar-se, por similaridade, uma espécie de latrocínio, na acepção do termo, vez que resultará em morte por destruição perversa e desnecessária de creche, ginásio, estádio, enfim, equipamentos de serventia pública, para educação, esporte e lazer, que de algum modo, representam forma indireta de valorização, educação e eugenia de vidas humanas.
Já foi dito muitas vezes, que esse malfadado elefante branco, poderia ter sido programado para outro lugar mais adequado, poupando o que já existe e que custou o dinheiro do povo, já que somos pobres e não podemos admitir desperdício.
Mas o que vem prevalecendo na mentalidade doentia dos governantes atuais é a perversidade e a morbidez de uma engenharia de destruição e vandalismo gratuito, ou quem sabe, a prevalência da tese, “quanto maior a caça mais nacos da carniça para satisfazer a gula pantagruélica dos abutres”.
Ironicamente, há poucos meses atrás, essa engenharia acariciava a idéia de conservar o patrimônio, e agora avoca o direito de ser seu principal algoz, e aí, diz Augusto dos Anjos “a mão que afaga é a mesma que apedreja”. Dia virá em que o povo encerrará a carreira das nefastas oligarquias que vêm nos empobrecendo nos últimos 50 anos.
Para mim, aquele local outrora sacralizado pela única missa aqui rezada pelo Santo João Paulo II, passará a ser, dos escombros, apenas o “tumulo do formidável enterro de minha última quimera”.
Do irmão e amigo Moacyr
Em Natal, madrugada de 25 /04/2011
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"Estimado Irmão Moacyr,
ResponderExcluirAs pessoas quando envelhecem ficam mais sensíveis e, de certa forma, intolerantes. Eu estou no limiar da minha já pouca paciência. A breve demolição do Machadão vem doendo em mim, matando minhas melhores recordações do futebol, retirando da paisagem de Lagoa Nova aquele poema que, de tão belo, se mistura com a vegetação e a topografia do lugar. Parece que já nasceu ali com outros instrumentos da natureza.
O que fazer? GRITAR E GRITAR, PROTESTAR E PROTESTAR, LASTIMAR, CHORAR E NUNCA ESQUECER.
RECEBA A MINHA MAIOR SOLIDARIEDADE pelo assassinato desse seu filho de concreto. NO DIA FATAL ESTAREI AO SEU LADO, FRATERNO E AMIGO COMO SEMPRE.
Com o abraço dolorido de Carlos Gomes
(Vou divulgar em meu blog e enviar para nossos verdadeiros amigos)"
Caríssimos Carlos e Moacyr:
ResponderExcluirEfetive hoje,provavelmente pela última vez, no Estádio que a insensatez do Poder Público resolveu derrubar,Contemplei tristonho a beleza das linhas atualmente adoecidas pelo negligente abandono e lembrei-me dos momentos gloriosos vividos pelo futebol da nossa terra. A absurda vaidade dos políticos e administradores públicos não tem limites A obra de arte arquitetônica que deveria ser preservada e cuidada com esmero é tida como lixo e por essa razão deve ser varrida. A história não os perdoará. Se os destruidores das árvores são chamados arboricidas, não nos custa criar o neologismo estadicidas para os criminosos que vão pulverizar o poema de concreto armado. Continuo na trincheira ainda que nela seja sepultado. Afetuoso Abraço do Ciro José
RÉQUIEM PARA UM ESTÁDIO - Domingo, 24 de Abril de De: "José Carlos" Para: "CARLOS GOMES"
ResponderExcluirÉ triste e mais ainda quando cresce a probabilidade de ocorrência de fatos deploráveis e nada éticos. Deus queira que eu esteja equivocado!
De: Airton Viegas Para: carlos_rosso2003@yahoo.com.br
ResponderExcluirEnviadas: Segunda-feira, 25 de Abril de 2011 11:38:52
Assunto: RE: [turmadobonfim] Enc: Enc: RÉQUIEM PARA UM ESTÁDIO
Caro Carlos
O mais lamentável dessa demolição é que estarão destruindo um monumento público, desperdiçando o dinheiro público, agredindo a paisagem pública....para em seguida erigir um monumento ao desperdício e a sub-utilização, ja que o futebol do RN não requer e nem suporta os custos operacionais de um estádio do nível da Arena das Dunas que pretendem construir em seu lugar.
Em Sao Luis, a minha cidade natal, bem ali, e com os mesmos 900 mil habitantes do Natal, construiram ha cerca de 20 anos atras um estadio para 70 mil espectadores, o Castelão (Estádio João Castelo): Um monumento ao desprezo dos politicos locais pelo dinheiro publico.
No jogo de inauguração, Seleção Brasileira (a canarinho, principal mesmo) vs Seleção Portuguesa ele só recebeu 50 mil pessoas das 70 mil que poderia receber !!!!
De la pra cá nunca mais recebeu mais que 20 mil ou 30 mil, nem em jogos pelas finais de campeonato ou partidas pela Copa do Brasil.
Hoje, de tão pouco que la se joga, ele esta interditado pela defesa civil : O campo tomado pelo mato, a praça e o estacionamento habitado por mendigos, sem-teto e outros moradores de rua, tem a estrutura deteriorada pelos agentes da natureza com ameaça de desabamento : Os (paupérrimos) clubes de futebol da cidade nao conseguem pagar os custos operacionais do estadio gigantesco com as parcas rendas das partidas e preferem jogar no antigo "Nhozinho Santos" com capacidade para 19.000 pessoas, e que, mesmo assim, raramente lota.
Embora seja Natalense apenas de coração, me solidarizo com aqueles que protestam contra essa agressão à nossa cidade.
um abraço
airton
P.S. O sr João Castelo, que, quando governador do estado do MA, construiu o Castelão está solto !!!! e ainda se candidata ao governo vez por outra!!!
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To:
From: carlos_rosso2003@yahoo.com.br
Date: Mon, 25 Apr 2011 06:32:24 -0700
Subject: [turmadobonfim] Enc: Enc: RÉQUIEM PARA UM ESTÁDIO
Amigos,
ResponderExcluirIniciando a semana, postamos um desabafo do Prof. Carlos Gomes, sobre
a derrubada do Estádio Machadão, com o título "Réquiem para um
estádio" (http://kennedydiogenes.blogspot.com/2011/04/requiem-para-um-estadio.html).
Meditando a respeito do texto, sabemos que o maior desafio urbano é a
compatibilização do progresso com a própria história, propiciando o
crescimento sem a perda da memória. Será que, no passado, grandes
monumentos, atualmente declarados como patrimônio da humanidade, como
o Panteão, em Roma, o Louvre, em Paris, a fonte da Cibele, em Madri,
não foram vistos como meros estorvos ao progresso destas cidades? No
entanto, no "mundo civilizado", os monumentos foram preservados, pois
a história de um povo é tão importante quanto seu futuro, porque
aquela define este. É realmente uma pena que não haja consciência
histórica nas terras de Poti.
Acessem o Blog Algumas Palavras (www.kennedydiogenes.blogspot.com).
Um abraço e boa semana.
Kennedy Diógenes
kleber disse...
ResponderExcluirParabenizo o autor pelo excelente artigo, em que nos faz refletir sobre que cidade queremos. Parabenizo também o organizador deste blog, por sempre estar publicando artigos bastante relevantes para nossa cidade.
25 de abril de 2011 10:52
Licurgo Nunes Neto disse...
ResponderExcluirMesmo que me faltem as glórias como as de Alberi para servir de contraste, fico aqui a imaginar quão infausto é o destino de um povo ignorante que se deixa guiar pelas falácias de uma classe governante inculta e irresponsável (a bombordo e a estibordo).
Parabéns pelo artigo. Saiba que sua voz não ecoa no vazio. Embora desconfie que isto não resolve muito, pior é a omissão e o silêncio dos que ainda conservam a capacidade de se indignar.
25 de abril de 2011 14:27
De: Ernani Rosado
ResponderExcluirPara: CARLOS ROSSO
Enviadas: Segunda-feira, 25 de Abril de 2011 16:22:19
Assunto: RES: Enc: RÉQUIEM PARA UM ESTÁDIO
Um verdadeiro absurdo essa demolição do Machadão, em se sabendo que o próprio Moacyr ofereceu uma alternativa de projeto dando os mesmos resultados sem essa “euforia destrutiva”.
Um abraço
ernani
De: marivaldo ernesto dos santos [mailto:marivaldoernesto@hotmail.com]
ResponderExcluirEnviada em: segunda-feira, 25 de abril de 2011 19:45
Para: jose.gomes@supercabo.com.br; mgc_arq@hotmail.com; rep-aecio@ig.com.br
Assunto: Réquiem
Amigo Moacyr,
ou José Cancão Sinatra Gomes,
este é o menino de Glorinha Oliveira,
se possível mande para ele,
"rep-aecio@ig.com.br"
os anexos solicitados abaixo.
abaixo.
Agradeço,
Mariva.
Subject: Re: RÉQUIEM PARA UM ESTÁDIO e o outro.
From: rep-aecio@ig.com.br
To: marivaldoernesto@hotmail.com
Meu caro Mariva!
DEUS nos deu amigo velho o privilégio de privar da amizade dessas magníficicas pessoas, desses dois poetas de reputação ilibada, em todas atividades de suas vidas. O arquiteto e o advogado me emocionaram com seus escritos, misto de crônica e desabafo.
Abração do mano que está triste com essa situação criada por pessoas de interesses espúrios.
Aécio
Copa 2.014
ResponderExcluir===================================================================
Jornal virtual de Roberto Guedes - 173
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Irmãos
Todo norte-rio-grandense que preza o interesse público deve ler os textos que os irmãos Carlos Roberto e Moacyr Gomes da Costa escreveram como correspondência de um para o outro nos últimos dias, focalizando o que espreita o estádio municipal João Machado, em Natal. Os depoimentos estão na seção “Interesse Público” desta edição do “Jornal de Roberto Guedes Via e-mail”.
Solidário às mensagens dos meus irmãos, antes de repassá-las, descrevo as seguintes palavras:
ResponderExcluir“ATÉ O HOMEM DE LATA DO MÁGICO DE OZ, NA SUA CAMINHADA À PROCURA DE UM CORAÇÃO, PARA EXTERNAR SEUS SENTIMENTOS DE BONDADE, FOI MAIS RACIONAL DO QUE A MAIORIA DOS ATUAIS POLÍTICOS DO NOSSO ESTADO”.
José Gomes Filho
Meu querido mestre e amigo,
ResponderExcluirEstou solidário com a sua indignação.
Porque não manter o machadão e se fosse ocaso construir outro, sem o custo adicioanal da demolição.
E os milhões do erário público jogados fora com o desnecessário?
abraços de Manoel Marques