CLARICE
- A FADA MADRINHA
Diogenes da Cunha Lima
A belíssima pernambucana Clarice
Lispector (1920 - 1977), nascida na Ucrânia, é uma das melhores escritoras
brasileiras.
A sua vida e obra foram sempre cheias de
experiências místicas, de mistério.
O
seu nome já indicava o destino. Em seu nascimento, ganhou o nome de Vida, em
hebraico. No Brasil, mudou para o bíblico Clarice, que significa “a luminosa”.
Apaixonado por ela, o poeta Carlos Drummond de Andrade teve uma visão onírica e
contou em poema: “Sinto a bruxa presa na zona da luz”.
Foi
a convidada especial para o Congresso das Bruxas, realizado na Colômbia, em
1975. Faziam parte da reunião mulheres cientistas, assim como psicólogas,
psiquiatras, sociólogas. E não eram bruxas de nariz adunco, voando escanchadas
em uma vassoura, eram bem apessoadas. Clarice encantou com seu charme único e
pela escrita enigmática. Foi lido, em espanhol, o texto hermético do seu conto
“O Ovo e a Galinha”. Foi a fada madrinha das bruxas. A sua singular beleza,
aliada à capacidade de desnudar e dar nova vestimenta às palavras, tornou-a o
encanto das atenções.
Certa
vez, ela caminhava distraída em Copacabana, quando sentiu que “era mãe de Deus,
a mãe do mundo”. Com um choque, ela perdeu o êxtase ao encontrar um grande rato
morto. Esta é uma das suas contradições simbólicas.
Sobre
a sua viagem ao Egito, uma pessoa perguntou-lhe se ela iria desvendar o segredo
da esfinge. Ela respondeu que não sabia se a esfinge conseguiria decifrar o
seu.
Indagada
por que os seus contos não obedeciam à praxe de ter começo, meio e fim, a
pessoa sugeriu que ela fizesse um assim. Imediatamente, ela atendeu o pedido.
Disse: “Era uma vez um pássaro/ meu Deus! ”
Os
advogados utilizam a sintética expressão latina “Ab ovo”, que quer dizer no
princípio de tudo. Imagino que esta foi a motivação de Clarice para escrever “O
Ovo e a Galinha”. Nele estão contidas todas as surpresas, o pensamento
esotérico. Alguns exemplos: “De ovo a ovo, chega-se a Deus”. “A Lua é habitada
por ovos” ou “Ovo sobre azul” e a declaração sentimental: “eu te amo, ovo”.
O
exotismo continua: “O ovo, por enquanto, será sempre revolucionário”. Enquanto
que: “A galinha vive como em sonho. Não tem senso de realidade, a galinha só
tem mesmo vida interior”.
Clarice
Lispector era amante do ovo: “O amor pelo ovo é super sensível. A gente não
sabe que ama o ovo”.
Clarice
tenta explicar este fascínio criativo: “O meu mistério é ser apenas um meio, e
não o fim, tem-me dado as mais maliciosas das liberdades”. E finaliza: “Tenho
usado esse tempo para prazeres ilícitos e dores ilícitas. Nem meu espelho
reflete mais o rosto que é meu”.
A
fada das bruxas é também a de críticos literários, brasileiros e do exterior,
dos amantes da literatura, de todos nós.
Convido
o leitor a decifrar o segredo e o enigma desta Fada.
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