quarta-feira, 7 de setembro de 2022

 



O Dia da Pátria

Padre João Medeiros Filho

Nestes dias, é importante relembrar o pensamento do filósofo Nicolau de Cusa: “Quem não ama verdadeiramente o seu torrão natal, é indigno dele.” É dever do cristão devotar-lhe um amor sincero. Cristo tinha um afeto especial por sua terra. Chorou sobre Jerusalém, antevendo os dias de infortúnio pelos quais a cidade passaria, em consequência de sua infidelidade a Deus (Lc 19, 41ss). É preciso refletir sobre os destinos da nação. Será que não se deve derramar lágrimas (como Jesus) ao constatar tanta desonestidade material e intelectual, falta de ética e honradez, além do desrespeito às virtudes humanas e cristãs? A pátria é muito mais que os poderes constituídos e seus ocupantes.

Pode parecer pessimismo. Mas, o Brasil está paulatinamente perdendo a sua identidade e consciência moral. Os costumes estão sendo dissolvidos, a dignidade ferida e o pudor bate em debandada. Falam mais alto a conveniência e os interesses partidários ou ideológicos do que o bem-estar do povo. Atualmente, autoridades são execradas, instituições escarnecidas, preceitos éticos envilecidos, comportamentos, por vezes minoritários, sendo impostos. Para muitos, o foco é desconstruir, conseguindo passividade e inércia. Há desencanto nos cidadãos. Os serviços públicos são abandonados a uma rotina letárgica. Após dois séculos, o Estado é considerado ainda ineficaz para uma multidão. Eça de Queiróz indagava a seus compatriotas: “O país está em crise, onde estão as análises sérias e as luzes postas sobre ele?” E nós, como perguntaremos? É hora de lembrar a Palavra de Deus: “Escutai, povo meu, de mim sairá a lei e o meu direito estabelecerei como luz dos povos” (Is 51, 4).

Os brasileiros provêm de uma variedade cultural e étnica. Isto gerou um país de múltiplas faces com elementos positivos e conflitos, muitos dos quais ainda não resolvidos. A história de uma nação não se resume a personagens e fatos constantes nos livros. Alguns acontecimentos mais decisivos envolvem pessoas que exercem funções de destaque. Entretanto, não se pode desprezar o contributo de tantos anônimos. Qual é a realidade atual do Brasil? Vive-se em inquietação e perplexidade. De quem é a responsabilidade? Uma análise objetiva da conjuntura é tarefa desafiadora. Cada partido, grupo ou pessoa tem seu ponto de vista, com o qual julga e projeta o país. Mas, muitos cidadãos são recalcitrantes e não se abrem a outras opiniões, fixando-se numa visão restrita e parcial da realidade. Assiste-se aos funerais do diálogo!

A situação do Brasil poderia e deveria ser bem melhor, considerando suas riquezas humanas e naturais. Entretanto, persistem incontáveis problemas, resultado da omissão, descaso e leviandade de certos governantes. Destacam-se a marginalização de muitos brasileiros, desigualdade social, diversas formas de violência, deficiente sistema educacional e precário acesso à saúde. Acrescentem-se a isso a manutenção iníqua e nociva de um grupo de privilegiados e a falta de reformas estruturais, há décadas reclamadas. Mudar esse quadro é imprescindível para que se tenha uma nação livre, justa e soberana.

Uma leitura adequada da realidade presente permite projetar o melhor possível para o amanhã. A doutrina social da Igreja apresenta exigências para a formação da sociedade. A primeira, agregando as demais, é o respeito à pessoa, como a essência de toda estrutura de Estado, da política e economia. Nenhum ser humano pode ser instrumentalizado e diminuído em sua dignidade. Desta e da igualdade de todos derivam: bem comum, subsidiariedade, participação e solidariedade. Daí, decorrem requisitos basilares da vida social: justiça, verdade e liberdade. Como existem diferentes leituras da realidade, há diversas propostas de construção do país. Os pressupostos humanistas e cristãos serão úteis para a definição dos planos e critérios de avaliação da qualidade das proposições.

É urgente reconstruir o Brasil. Para tanto, é preciso que venham a prevalecer as narrativas sérias, fazendo-o despertar para mudanças inadiáveis, varrendo os cenários de vergonhosas desigualdades, garantindo a permanência de postulados inarredáveis. “Dai ao povo brasileiro paz constante e prosperidade”, súplica que deve ser apresentada a Deus. E concluindo, convém lembrar a recomendação do Onipotente nas palavras do profeta Jeremias: “Procurai a paz para a terra onde vos coloquei. Orai a Deus por ela, pois de sua paz depende a vossa” (Jr 29, 7).


Nenhum comentário:

Postar um comentário