Antes dos anestésicos
Elísio Augusto de Medeiros e Silva
Empresário,
escritor e membro da AEILIJ
elisio@mercomix.com.br
Na sociedade vitoriana
pouca coisa provocava tanto temor as pessoas, quanto se submeter a um ato
cirúrgico. A administração da dor era um grande problema.
Não existia qualquer forma de anestesia, além
do ópio e do álcool, que só podiam ser administrados com moderação, em virtude
dos efeitos colaterais. A realização de qualquer procedimento cirúrgico era
visto como uma forma de tortura. Praticamente, o paciente sentia todas as
dores.
Os cirurgiões da época se
orgulhavam de sua rapidez, pois as longas operações eram insuportáveis para os
pacientes, bem como para eles. Procedimentos que hoje demoram horas eram
executados em poucos minutos, para diminuir o sofrimento.
Em 1811, a escritora
britânica Fanny Burney submeteu-se a uma mastectomia em Paris. Um ano depois,
em carta a uma irmã, descreveu a terrível experiência.
Teria sido administrado a
ela um vinho como única forma de anestesia. Foi em seguida acomodada em um
apertado cubículo, que fora montado em sua casa por uma equipe de sete
profissionais.
Então, deitada lado a lado
com compressas, bandagens e instrumentos cirúrgicos, teve o rosto coberto por
um lenço. Segundo sua própria descrição: “Quando
o aço terrível penetrou meu seio, cortando através das veias, artérias, carne,
nervos, nada havia que me impedisse de gritar. Soltei um grito que durou
interminavelmente por todo o tempo da incisão, e muito me espanto por não mais
ouvi-lo ecoando em meus ouvidos! Que agonia excruciante... Senti, então, a faca
chocando-se contra o esterno, raspando-o! Tudo se desenrolava enquanto eu
permanecia em uma tortura inteiramente muda”.
Antes de desmaiar,
praticamente em choque, depois da operação, viu de relance o médico que a operara
– “quase tão pálido quanto eu, o rosto
recoberto de sangue e a expressão de dor, apreensão e, quase, horror”.
Em outubro de 1846, no
Hospital Geral de Massachusetts em Boston, o dentista William Morton fez uma
demonstração pública da utilização do éter como anestésico.
A notícia logo atravessou
o Atlântico, e ainda naquele ano o dentista londrino James Robinson começou a
usar o éter em seus pacientes, o que causou espanto entre os médicos.
Na virada daquele ano, o
entusiasmo pelo éter se alastrava para além da comunidade médica, divulgado
pela imprensa. Muitas pessoas se interessaram pelo tema – um deles foi John
Snow.
Contudo, o milagroso
anestésico não era totalmente seguro. Algumas aplicações funcionavam muito bem
– o paciente adormecia pelo tempo que durava o procedimento, acordava minutos
depois, sem qualquer lembrança da operação e a sensação de dor era bastante
reduzida. Porém, alguns acordavam abruptamente no meio da cirurgia. E muitos
jamais acordaram.
O estudioso John Snow logo
aventou a hipótese de que fatos assim ocorriam por uma questão de dosagem e
iniciou uma série de experiências, a fim de determinar a melhor maneira de administrar
o milagroso gás. Snow organizou uma “Tabela para o cálculo da intensidade do
vapor do éter”, baseado na influência que teria a temperatura do local onde
estavam sendo realizados procedimentos cirúrgicos.
Enquanto concluía seus
estudos, Snow iniciou um trabalho com Daniel Ferguson, um fabricante de
instrumentos cirúrgicos, com o intuito de produzirem um inalador que permitisse
um melhor controle sobre o anestésico.
Em 1847, a comunidade
médica direcionou suas atenções para um novo anestésico – o clorofórmio – e
Snow passou também a pesquisá-lo. Em finais de 1848, Snow publicou uma monografia
sobre a teoria prática da anestesia.
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