domingo, 25 de novembro de 2012


RELEITURAS POÉTICAS


BIZÂNCIO 
(o poema reescrito)

A noite
guardo-a comigo

Não perdi Bizâncio

Dos conflitos afasto
armas e olhares mortais
e tudo que destrói pelo ódio

Não perdi Bizâncio
como quer
a crônica medieval tardia
que sobrepõe império
a império
num jogo de ilusão
e fantasia

E longe do assédio das disputas
vejo-a perene
com as flâmulas
do heroísmo de quem ama

Mortos?
o oráculo diz que não há mortos
ou sequer a morte

Há uma cruz:
in hoc signo vinces

Há um escudo para o tempo
e não são surdas essas muralhas
abertas à memória

Nas cisternas repletas
a água entoa o som imóvel
o cântico do silêncio

E continuam a comover-me
a tarde púrpura
o declínio do sol no ocidente
o acender das luzes no terraço sobre o Bósforo
o abraço da noite.

                                   Horácio Paiva


MEU SERTÃO DE ANTIGAMENTE

O fogão era a lenha;
O café era torrado em casa, batido no pilão;
A panela era de barro;
O sabão era em pedra, de oiticica;
O banho era de cuia e de balde;
O vaso de sanitário era de cimento e latrina;
A lâmpada era o candeeiro, a piraca e a lamparina;
A geladeira era o pote e a moringa;
O bebedouro era a 'quartinha';
A piscina era o açude;
O carro de lixo era a carroça;
O sapato era a sandália de couro;
A televisão era o rádio de marca ABC;
A fechadura era a tramela;
O supermercado era a bodega;
O baile era o assustado;
O mosquiteiro era o esterco de boi;
O refrigerante era o ponche de limão;
O carro era a carroça e o jumento.



No dia da cultura



Assim, sinto

O poeta quando escreve
Nem sempre é livremente.
Se expõe a sua dor,
Muitas vezes é lentamente.
O poeta, às vezes, sai
A voar e então cai
A chorar e então, mente...

E negando a sua dor,
O poeta, então inventa
Caminhos para emoção
Ser certeira e, argumenta:
“Minha dor é quase nada
Se ela for comparada,
Muito pouco representa.”

Daí passa a descrever
Uma dor universal,
Escondendo o que era seu
De maneira divinal
E com mundo e dividida,
Por muitos e entendida,
De maneira natural.

Por isso eu sou feliz
Independente de tudo.
Minha dor é quase nada,
Eis porque me calo e mundo
O sentindo de um poema,
Não me importa qual o tema,
Não me importa o absurdo!


Oliveira do Cordel





Olhei um moribundo e nele não encontrei o Homem.
Fechei os olhos e sai em busca do humano....
Vi lá adiante vários seres conversando.
Disse: - São homens,pois falam de guerra e fomentam o ódio.
Aproximando-me li nos seus rostos que eram apenas maquete
de um ser com alma.
Continuei a andar....

Já não mais queria ir, pois em todos os palácios,
em cada convento, em todo clero, em toda igreja,
em cada metrópole, eu procurara o Homem e não o achara.
Onde ele estará? Quem o escondera?

Senti então, que em todo lugar está o Homem.
No clero infame e santo na igreja autocrática e nos conventos indolentes,
nas metrópoles cruéis.
Mas porquê não o via antes?
Talvez por causa dos olhos, afinal  "a importância do homem está no nosso olhar e não no homem olhado".

Francisco Martins 


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