quinta-feira, 8 de novembro de 2012



Presença ainda viva

07 de Novembro de 2012     TN Colunas
http://www.tribunadonorte.com.br/coluna.php?id=2004&art=236025
Ticiano Duarte - jornalista

O Rio Grande do Norte comemorou este ano o centenário de nascimento do advogado, professor, jornalista, escritor, líder católico, Otto de Brito Guerra. Não pude comparecer às homenagens que lhe foram prestadas, mas, não poderia deixar de externar minha palavra de solidariedade à família e de admiração e respeito à vida de um homem que dignificou sua terra e seu povo.

A cidade de Natal sempre lhe reconheceu o idealismo, a lisura, a fé, o empreendedorismo, uma vida dedicada às obra sociais, católicas e leigas, ao seu trabalho de ajuda e fundação a inúmeras entidades tradicionais, elaborando seus estatutos e auxiliando nas suas primeiras administrações. Participante do movimento mariano, sob a chefia da grande figura de Ulisses de Góes; da Ação Católica, da qual foi presidente; do movimento Familiar Cristão; do Cursilho de Cristandade.

Como jornalista escreveu para muitos jornais e revistas e foi um baluarte na sustentação do jornal católico, “A Ordem”. Como advogado era realmente um defensor dos remediados, pobres e desassistidos, como confessou certa feita, em discurso que pronunciou na Câmara Municipal, quando lhe foi outorgado o título de cidadão natalense.

Em 1954, quando os poderosos partidos PSD e UDN selaram um acordo para eleger em chapa única, Georgino Avelino e Dinarte Mariz, senadores da República, um movimento de protesto lançou seu nome para disputar uma das vagas. Enfrentando o poder econômico e a base forte eleitoral e tradição política, Otto Guerra, embora derrotado, obteve maioria expressiva em Natal e em alguns municípios importantes do Rio Grande do Norte. Aqui em Natal, derrotou a chapa única por uma maioria de votos que o consagrou, pelo fato de ter somente o apoio partidário da família Rosado e do pequeno PTB, liderado pelo industrial João Francisco da Mota. Uma vez confessou-me de ter um sentimento grandioso de gratidão ao povo de Natal, por esse fato histórico das disputas eleitorais em nossa terra.

Foi testemunha dos fatos mais importantes da nossa história política nesses últimos setenta anos, como a revolução de 1930, a intentona de 1935, que chegou a instalar em Natal um governo comunista, as vicissitudes, como dizia, “os sobressaltos da segunda guerra mundial, quando vivemos largo tempo em black out, e o movimento de 1964, quando defendi estudantes e professores”.

Esse último período a que Otto Guerra se referiu, o de 1964, sou testemunha de sua postura, de ferrenho oposicionista ao regime militar que se instalou no país durante vinte anos. De sua indignação contra os atos de restrições à liberdade, de prisões arbitrárias, de censura aos meios de comunicação, de perseguições aos que divergiam dos seus rumos.

Otto Guerra também participou da fundação da emissora de Educação Rural, pioneira, no Brasil, e alfabetização e politização pelo rádio, integrando com o então bispo, Eugênio Sales e o então monsenhor Nivaldo Monte, a direção da emissora. Foi pioneiro, também, na batalha pela sindicalização rural, fundando o Círculo Operário, cujas sementes foram lançadas no Rio Grande do Sul, pelo padre Leopoldo Brentano. Professor fundador da Faculdade de Direito, da Universidade do Rio Grande do Norte, da Academia Norte-rio-grandense de Letras, do Conselho Estadual de Cultura.

Foi um homem acima do seu tempo. Tinha inteligência e saber, mas possuía uma coisa rara, como costumo dizer nestes tempos de desencantos e desencontros, uma bondade, uma ternura, um amor pelos homens e pela família, pelas causas que abraçou com coragem e desassombro.

Otto viveu uma vida de santidade. O Rio Grande do Norte não pode esquecê-lo, pois ele continua presente pela força da decência, do idealismo, da sensatez, do pioneirismo, da probidade. Parece que o estou vendo, aos domingos, como fazia sempre, na companhia de sua esposa, em direção a banca dos jornais no centro da cidade, dando-nos a certeza de que sua luta continua e aos que ficaram, como disse Edgar Barbosa sobre o padre Monte, que as suas armas não foram esquecidas.

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