quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

 

 As origens da festa do Natal

Padre João Medeiros Filho

Segundo historiadores, a celebração do Natal remonta ao ano 440, quando o Papa São Leão Magno instituiu a missa “In Nativitate Domini”. Não há registro exato da data do nascimento de Jesus. O dia 25 de dezembro é a cristianização de algumas festas romanas e gregas. Em Roma, eram tradicionais as “Saturnaliae” (Saturnais), em homenagem ao deus Saturno. De acordo com a mitologia, tendo ele sido destronado por Júpiter, fugiu para a Ausônia (Itália). Ali, reinou durante a idade áurea do Império Romano. Em memória desse reinado benéfico, celebravam-se no início do inverno as Festas Saturnais. Pode-se verificar que em tais comemorações havia aspectos análogos à celebração do Natal cristão. Nas Saturnais, suspendiam-se as atividades e serviços públicos (hoje recesso natalino), declarações de guerra, execuções de penas (indulto de Natal) e os amigos trocavam presentes. As árvores eram enfeitadas para que brilhassem (árvores natalinas). Cantava-se e dançava-se em agradecimento a Saturno, divindade da fartura e da vida.

Havia paz e fraternidade. O poeta latino Virgílio aludiu a essa época: “Eis que a Justiça está de volta com o reino de Saturno.” As Saturnais pretendiam lembrar o estado paradisíaco, obter proteção para os campos e os habitantes. Além dos festejos citados, na ocasião havia uma grande ceia, em que todos fraternalmente se colocavam à mesa. A refeição tinha por objetivo mostrar que todos os seres humanos são iguais e os bens da terra lhes pertencem. As igrejas cristãs ensinam que Jesus veio instaurar um reino de Amor, Justiça e Paz. O Filho de Deus se encarnou para proclamar a nossa fraternidade e sentar todos à mesma mesa (Eucaristia) para um banquete oferecido por Deus. Para os cristãos Jesus é o maior dom divino para os homens e seguindo o seu exemplo, há a oferta de presentes. A partir do Édito de Milão, os romanos foram se reunindo, não mais para celebrar uma deidade frágil, mas o Deus Eterno.

Na mitologia grega, Hélios (o deus Sol) é filho de uma virgem chamada Téia. Ele, conhecedor das mazelas do mundo, era a divindade da luz, capaz de trazer vida, curar, queimar e cegar. Consoante a lenda, recebeu de Netuno a cidade de Corinto, onde era adorado por seus habitantes. Estes propagaram por toda a Grécia a festa de Hélios. No solstício do inverno – entre 22 e 23 de dezembro, no hemisfério norte – os coríntios costumavam celebrar a festa do Sol, quando se cantava e pedia que ele não se afastasse da terra e ali não dominassem as trevas, encobrindo as cidades. Em geral, tal festividade tinha o seu ápice no segundo ou terceiro dia, ou seja, em 25 de dezembro.

A Igreja, partindo dessa tradição, começou a celebrar Aquele que é a Luz do Mundo, “Sol da Justiça e da Paz”, preconizado pelo profeta Isaías (Is 32, 1). Segundo a crença helênica, os rigores do inverno deveriam ser amenizados com a proteção do Sol (Hélios). E segundo a concepção do cristianismo, o gelo da insensibilidade, do egoísmo e ódio será eliminado por Aquele que aquece os nossos corações. “Sol divino, aquecei as nossas almas”, reza-se na Sequência da Missa de Pentecostes.

Virgílio já proclamava: “Quando o sol se põe, viaja para as entranhas da noite escura”. Assim, Cristo ausentando-se de nossas vidas e da sociedade, haverá trevas. Narram os relatos da Paixão do Senhor: “Quando Ele expirou, a terra cobriu-se de trevas” (Mt 27, 45). O Filho de Deus apresenta-se a seus contemporâneos como Luz: “Eu sou a Luz do mundo, quem me segue não anda nas trevas. (Jo 8, 12). Carl Gustav Jung remete o simbolismo de Hélios ao próprio Cristo: “O sol nasce cada dia, é imortal, retrata a força suprema do espírito e da alma, a verdade e o amor.” O Filho de Deus é imortal e nossa fortaleza, como afirma o apóstolo Paulo: “Tudo posso Naquele que me fortalece” (Fl 4, 13). Ele assim se define: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6). Jesus é inegavelmente a ternura divina, como descreve o evangelista João: “Deus é Amor” (1Jo 4, 8).