quinta-feira, 19 de agosto de 2021

NA ROTA DO CAVALO-MARINHO

 

Diogenes da Cunha Lima

 

A Rota do Cavalo-Marinho é onde a natureza faz a festa. Dela participam os municípios praieiros de Galinhos, Guamaré e Macau.

Vejamos Guamaré. Acolhedoras pousadas e hotéis são disponíveis aos turistas. O forte da economia está na refinaria de petróleo Clara Camarão, ainda que nos últimos tempos pouco valorizada pela Petrobras.

No município, foram implantadas as primeiras torres geradoras de energia eólica. À noite, piscam as luzes de incontáveis geradores. O Rio Grande do Norte é pura energia.

Nas águas paradas, reproduzem-se viveiros de peixes. O turista que adere aos passeios de canoa encanta-se com a festa da natureza. O barqueiro é também pescador e pode ser um poeta, como Adisson Gleidson, que inicia a recitação de um poema, de sua autoria, de louvor à praia. O navego é feito sobre o verde das águas, as quais refletem as árvores do mangue, com belezas insuspeitadas, em formas e tonalidades. De súbito, voam garças azuis e brancas. Se estiver com sorte, o visitante encontra golfinhos, arraias, tartarugas e peixes que pulam fora d´água.

A canoa aporta em uma ilhota à beira de uma gamboa. Logo, o piloto do barco retorna e traz consigo, em um grande frasco com água, dois cavalos-marinhos, ambos grávidos. Como é sabido, cabe ao macho a tarefa de engravidar. Os peixes fósseis são devolvidos ao seu natural habitat.

As ilhotas são lugares para encontro festivo, com música e alegrias culinárias, com peixes pescados há pouco. Há certa pressa porque a maré sobe rápido e a ilhota fica submersa.

Guamaré abriga pessoas singulares. Não duvide! É a cidade de Pablo Neruda, o verdadeiro, que é músico. Toca violino, violão e contrabaixo. Entre os clássicos, sua predileção é por Mozart, mas também sabe encantar com a música popular. Seu nome de batismo, entre doze irmãos, decorreu da paixão de seu pai marinheiro pela poesia do poeta chileno (Ricardo Eliécer Neftalí Reyes Basoalto), que adotara o pseudônimo de Pablo Neruda.

Não se deve esquecer a sedução das praias da Pipa, São Miguel do Gostoso e Maracajaú. Mas Guamaré, certamente, será a grande descoberta do turismo ecológico.

Faz-se necessária e urgente a união dos líderes das comunidades para tornar efetiva, de grande valor econômico e social, a Rota do Cavalo-Marinho, com o símbolo sugestivo do belo e elegante animal que enfeitam suas águas.

As praias da Rota são vocacionadas ao ecoturismo, o aproveitamento do seu patrimônio natural e cultural para fins de usufruto e conscientização.

Galinhos e Macau completam a Rota. Vale a pena descobrir suas belezas, potencial turístico, riqueza única do marítimo Rio Grande do Norte.

 

 

 Viva a insulina 

Daladier Pessoa Cunha Lima Reitor do UNI-RN

 “Uma noite eu tive a sede de um príncipe/depois a de um rei/depois a de um império/a de um mundo/em fogo.” Eis os primeiros versos do poema Diabetes, do poeta norte-americano James Dickei (1920-1986), sobre essa doença de alta prevalência no planeta, e que, no Brasil, afeta cerca de 17 milhões de seres humanos. Deve-se ao médico da Grécia Antiga Arateu da Capadócia uma das mais remotas referências à Diabetes mellitus: “Uma fusão de corpo e membros na urina”. Diabético, meu pai contava para os filhos o começo da sua doença: “Quanto mais água eu tomava, mais sede eu sentia, e quanto mais alimento eu comia, mais magro ficava”. Suas palavras fazem lembrar as descrições do médico Arateu e do poeta James Dickei. A Diabetes é para mim doença bem conhecida, não como portador, mas como envolvido espectador. É frustrante quando olhamos para a história da medicina e vemos como era lenta a sua evolução. Durante séculos seguidos, os meios diagnósticos e as terapias avançavam muito devagar, com pouquíssimas exceções. Somente a partir do século 18, com o florescer do método científico, a humanidade vislumbrou grandes avanços na área médica e em outras áreas do conhecimento. Existem marcos desses avanços, a exemplo da adoção da antissepsia, as descobertas da anestesia, das vacinas, dos antibióticos e do raio x, além de vários outros. Porém, um dos marcos dos avanços médicos de grande significação foi a descoberta da insulina, evento que ocorreu 100 anos atrás, em Toronto, no Canadá. Depois da terapia com esse hormônio, mormente de pessoas com Diabetes mellitus insulino dependentes, quantas vidas foram salvas, quantos enfermos ganharam outro ânimo e quantos sorrisos voltaram às faces dos portadores dessa disfunção metabólica, com ênfase para as crianças ou jovens e seus familiares. Meu pai, Diogenes da Cunha Lima (1906-1972), passou a receber insulina logo após esse medicamento ser comercializado. Morava em Nova Cruz-RN, e tomava três doses diárias de insulina regular, conforme prescrição do seu médico, da cidade de João Pessoa-PB. Aumentava ou diminuía a dosagem de acordo com o nível da glicosúria, exame que ele mesmo fazia. Hoje, o paciente dispõe de meios simples e mais precisos no controle da doença, essencial para evitar as complicações. Com seu médico, meu pai aprendeu conceitos básicos da Diabetes, bem assim por leitura de livros indicados pelo especialista. Contou com dois Anjos da Guarda, o de nascença e minha mãe, sempre ao seu lado “na saúde e na doença”. Nos 100 anos da descoberta da insulina, é hora de relembrar quantos contribuíram para esse marco da medicina, especialmente dos médicos Frederich Banting (1891-1941), John Macleod (1876- 1935) e Charles Best (1899-1978), além do bioquímico James Collip (1892-1965). Banting e Macleod receberam o Nobel de Medicina, em 1923, mas dividiram o Prêmio com os outros dois. Texto publicado na Tribuna do Norte, em 19/08/2021

 


 

O pelourinho e a escravidão no Rio Grande do Norte

História Rio Grande do Norte

 

 

Gustavo Sobral e André Felipe Pignataro [HGRN]

 

O museu do Instituto guarda algumas peças que marcam, para que não se esqueça, o nefasto período da escravidão no Rio Grande do Norte. Período longo e degradante da história colonial e imperial do Brasil.

 

Os historiadores apontam que os primeiros escravizados africanos no Rio Grande do Norte, vieram de Pernambuco para trabalho forçado nos engenhos de açúcar, e para servir na pecuária e nas lavouras de algodão no sertão. Na segunda metade do século XIX, foram também trazidos do Maranhão, desembarcados nos portos de Areia Branca e Macau, para trabalhos forçados nas salinas do litoral norte.

 

Leia o texto na íntegra na Tribuna do Norte

http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/o-pelourinho-e-a-escravida-o-no-rio-grande-do-norte/517695

 

 


A urgência da credibilidade

Padre João Medeiros Filho

Atualmente, uma das perguntas frequentes é a seguinte: “Em quem posso acreditar?” Oxalá, houvesse a mesma certeza do apóstolo Paulo, quando se dirigiu a seu discípulo Timóteo: “Sei em quem acreditei.” (2Tm 1, 12). Diante de tantas notícias veiculadas nas redes sociais e na mídia tradicional, é cada vez mais difícil identificar palavras credíveis. No entanto, trata-se de uma urgência, diante de inúmeras inverdades que circulam em vários setores da sociedade brasileira contemporânea. É raro ter conhecimento de relatos que inspirem credibilidade, sem embustes. Necessita-se de pronunciamentos que efetivamente sejam alicerçados na confiabilidade. Deve-se nutrir a sociedade com debates verdadeiros, indispensáveis à recomposição do tecido sociopolítico. Não basta somente dizer o que se pensa, nem opinar a partir de visões parciais, atreladas a grupos e ideologias. É imprescindível revitalizar o protagonismo de discursos críveis. Isto é uma obrigação cidadã e um dever cristão, impreteríveis para que se possa responder a opiniões polarizadas e falas que desagregam. Uma cidadania verdadeiramente qualificada sabe reconhecer a coerência e veracidade do que é propagado. Portanto, representa uma necessidade para o autêntico diálogo, capaz de edificar uma nação.

Infelizmente, há um entendimento equivocado por parte de certos políticos e dignitários brasileiros, impondo cerceamento e distorções, subjugando e atrasando inadiáveis transformações civilizatórias. Tais imposições são fortalecidas por equívocos partidários e contextos ideológicos. Estes são responsáveis pela inadequada concepção do bem-estar social e vêm neutralizando a configuração de uma cidadania propiciadora de novos rumos ao Brasil. É mister que tal aconteça, desde o âmbito da representatividade parlamentar e governamental à consciência participativa dos cidadãos, necessária ao bem coletivo. Urge reconstruir a civilização, a partir do impostergável compromisso de se promover a credibilidade.

Na Encíclica “Fratelli tutti”, o Papa Francisco insiste sobre a urgência da inegociável cultura do encontro para superar dialéticas que resultam em desavenças, inimizades e divisões. Note-se que no Brasil de hoje certos líderes políticos e autoridades dos diferentes poderes agem como promotores de polarizações, bloqueando e anulando possíveis avanços que dependem da capacidade de diálogo. Por isso mesmo, é necessário priorizar a confiabilidade, “deixando de lado toda mentira e dizendo somente a verdade”, como recomenda o apostolo Paulo (cf. Ef 4, 25). Por mais que se fale hoje em direitos, liberdade, democracia, diversidade e pluralidade, a prática e os resultados sociais mostram-se cada vez mais unilaterais, desrespeitosos, impositivos e radicais. Deseja-se um estilo de vida, em que as autênticas diferenças humanas possam conviver integradas, iluminadas e enriquecidas reciprocamente. A fragmentação da sociedade é altamente deletéria.

No Brasil hodierno, contaminado por tantos arrogantes e presunçosos, pressiona-se o trânsito da mentira ou meia verdade. Há os que deliram, como se deuses fossem, ditando normas e regras, à base de sofismas e equívocos. A consequência é o descrédito e a recusa. E não falta quem lute para impingir o falso como verdade, o desonesto ou “jeitinho”, como padrão ético. Torna-se urgente uma cultura renovada, fruto de dinâmicas oriundas de diálogos autênticos. Estes devem buscar alternativas e respostas inovadoras, qualificando escolhas. Importa renunciar à sede de querer impor ideias e opiniões obsoletas. Estas resultam, não raro, de cristalizações subjetivas ou interesses balizados na mesquinhez e ganância. Nesse importante processo de reconstrução social, necessita-se de posturas confiáveis, capazes de promover a paz, superando radicalismos delineados em contendas partidárias com interesses escusos.

Certa feita, ouvimos do senador Affonso Arinos, falando à comunidade do Colégio Santo Inácio de Loyola (RJ): “Se os partidos políticos carregarem em suas entranhas interesses mesquinhos, as campanhas eleitorais tornar-se-ão falaciosas e patranheiros ou ilusórios serão os parlamentos e governos.”  As manifestações sinceras e transparentes são indissociáveis da capacidade de dialogar. Deve-se exigir no trato social a confiabilidade e a verdade, bem diferentes dos discursos populistas e manipuladores. Vale ainda lembrar o eminente acadêmico pernambucano, Dom José Pereira Alves, terceiro bispo diocesano de Natal, em sermão proferido, na antiga catedral, perorando com estas palavras: “Usemos as armas do diálogo e da verdade. Se somos discípulos de Cristo – e Ele é a Verdade – nosso caminho de cristãos consiste em ser verdadeiros e probos!”

 

 

Reconstruir o brasil é preciso

padre João Medeiros Filho

A reconstrução é um processo normal, durante a vida humana, individual ou social. Mestres dos saberes esforçam-se por apontar uma dinâmica reconstrutiva eficaz. O Brasil, em diferentes momentos de sua história, passou por várias crises. Seu povo lutou pela democracia. No entanto, continua recebendo acenos totalitários, ora abscônditos, ora patentes, advindos de pessoas ou grupos que se jactam de discursos democráticos, embora sedentos de dominação. Adentrando na terceira década do milênio, interpela-se a consciência cidadã e cristã sobre a ingente necessidade de soerguimento da nação. A pandemia inscreveu no horizonte da cidadania a urgência de se repensar a sociedade. Governos teimam em não admitir, mas o flagelo pandêmico revelou a fragilidade (em alguns casos, falência) de vários setores, mormente da saúde e educação. Comprovou, no mínimo, uma deficiência crônica. “Saúde e educação de um povo não se improvisam”, afirmou Dr. Marcolino Candau, primeiro brasileiro a dirigir a Organização Mundial da Saúde (OMS).  Os desdobramentos pandêmicos com impactos econômicos e aumento da desigualdade social, acarretando desemprego e fome, clamam pela reformulação da pátria. Enquanto isso, o tempo precioso para debates e planejamentos está sendo desperdiçado por lideranças e autoridades com diatribes ou polêmicas ideológicas dispensáveis e lesivas. Convém lembrar o salmista: “Se o Senhor não edificar a casa, debalde trabalham os que a constroem” (Sl 127, 1).

Análises científicas apontam uma crescente e perigosa deterioração da conjuntura sociopolítica, comprometendo a estrutura da sociedade. Seus alicerces foram abalados por desmandos administrativos, privilégios, demagogia, corrupção e ensaios ideológicos despropositados. Isso requer mais lucidez e serenas considerações dos cidadãos. Há anos, um parlamentar norte-rio-grandense comparou a política nacional com “uma moça volúvel, cujos familiares tentam mostrá-la recatada e virtuosa”. Será que mudou? Cresce em muitos o sentimento de intervenções prementes para evitar que se instale na sociedade a “abominação da desolação” (cf. Mt 24, 15; Dn 12, 11 e Dn 13, 14). Tal expressão bíblica define o caos a que chegou o povo hebreu prevaricador da Antiga Aliança. A história do Brasil, não obstante seus percalços e vicissitudes, merece respeito. A nação detém um relevante potencial humanístico para se reerguer. Entretanto, não deve se tornar refém de amadores, oportunistas e inescrupulosos, cujo objetivo precípuo é um projeto de poder e não uma nação equilibrada, harmônica e justa.

A ferida política diagnosticada é preocupante. O país carece de uma visão moderna sobre gestão, que possa oferecer respostas adequadas e atualizadas. Percebem-se sérias degradações em vários setores das diferentes esferas públicas. É imprescindível um novo movimento civilizatório, em que se lute para deter a fragmentação da sociedade. Muitos preferem o axioma romano atribuído a Cesar: “Divide et impera”. O Brasil caracteriza-se por viver antecipadamente o clima de período eleitoral, sempre contaminado pelos mesmos vícios. Deste modo, reduz-se a indispensável discussão política a ideias de pessoas que queiram impingir esquemas obsoletos, perpetuando dinastias de privilégios e erros. Os brasileiros esperam dos líderes e dignitários não uma disputa medíocre e estéril – inflando o ego de alguns – mas uma ampla pauta dialogal civilizatória. Esta inclui necessariamente uma redobrada vigilância no linguajar, uso equilibrado e calcado na honestidade intelectual das redes sociais, tecnologias contemporâneas e mídia.

As narrativas estão cada vez mais medíocres e falaciosas, impedindo avanços e clarividências. Convive-se com falas descarrilhadas, incompatíveis com os cargos ocupados, comprometendo a seriedade e a solidez das instituições. Muitos pronunciamentos geram mal-estar, acarretando polarizações, fortalecendo radicalismos, alimentando medos e desconfianças. Para reerguer o Brasil, convém investir em discursos e posturas esclarecedoras da verdade. Queira Deus venham posicionamentos capazes de ocasionar mudanças em função de novo ciclo civilizatório. Praza aos céus que efetivamente se respeitem dignidades e direitos, salvaguardando a pátria com políticas sensatas. Urge varrer cenários de vergonhosas injustiças e desigualdades sociais, bem como garantir a vigência de valores e princípios humanistas. Assim, poder-se-á recompor o Brasil. Ensina-nos a Sagrada Escritura: “Crescei e multiplicai-vos.” (Gn 9, 7). Isso não é apenas um indicativo de procriação ou demográfico. Há que se atentar também para o sentido metafórico: “crescei” em sabedoria, “multiplicai” o bem-estar dos filhos de Deus!