sábado, 31 de dezembro de 2022

 


Mensagem do Ano Novo de 2023

 

No alvorecer de um Novo Ano, celebram-se o Dia Mundial da Paz e a solenidade cristã de Maria, Mãe de Deus, portadora da Paz. Na Virgem Santíssima aproximaram-se o Criador e a criatura. No seu coração palpitavam o Eterno e o temporal. Nela, o Onipotente uma vez mais demonstrou sua vontade de nos amar. Maria é plena de Graça. O que nos leva à violência é a ausência de Deus, deixando a criatura humana sem rumo. O pecado gera a guerra, qualquer que seja a sua dimensão. Maria é a Mãe e Rainha da Paz.

Desejamos a todos um ano de graça e concórdia, diálogo e encontro. Que em 2023 sopre constantemente a brisa suave da Paz, da alegria, da esperança; nos embalem ondas de amor, ânimo e coragem e a saúde faça sua morada em nosso corpo e em nossa mente. Que desvaneçam a mentira, as agressões, a desarmonia, a injustiça e o espírito de vingança. Possa a fé nos envolver e fortalecer para enfrentar os desafios do Novo Ano que desponta. E que as maravilhosas bênçãos de Deus se irradiem por toda a humanidade e pelo mundo inteiro. Um Ano Feliz para todos, fecundo de Deus, sem tristezas e sofrimento e com um bom inverno. São os votos de Padre João Medeiros Filho e seus familiares. Um abraço fraterno e minha bênção sacerdotal, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém

 

sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

 

SEGUIR JESUS

Valério Mesquita*

Mesquita.valerio@gmail.com

Ouço uma voz que me diz, lá dos confins do mundo, que a única lição importante é seguir Jesus. No Brasil, a força da mídia eletrônica influencia mais que a religião. Impõe vícios, deturpam hábitos, derrubam códigos e mandamentos. A necessidade vital de se fazer conhecer a pessoa e a mensagem de Jesus, está sendo suplantada pela liberalidade dos costumes e vícios. O postulado institucional da família com Deus está sendo mutilado. Jesus já não constitui o melhor que temos nas igrejas e o melhor que podemos oferecer hoje à sociedade moderna. E Ele continua ainda o melhor que a humanidade já produziu. Jamais deixou de ser o potencial mais admirável de luz e de esperança que os seres humanos podem contar. Somente tenho a deplorar, que sem Ele, o horizonte da história se empobrecerá caso caia no esquecimento. 

A luta que se trava no país para substituir a família constituída no casamento por um homem e uma mulher, não pode submergir na crise e na confusão dos sexos. A família brasileira sofre a hostilidade ostensiva dos desajustados sob a passividade das igrejas que não se entendem. Preferem o duelo das escaramuças dogmáticas no pretório das iniquidades. Onde está o maior inimigo hoje da família propugnada nos ensinamentos cristãos? Quem levanta as multidões nas ruas para consagrar a sodomia, a droga e a subversão das leis e dos bons costumes? Todos sabem. Não preciso apontar. São pouquíssimos os religiosos que se levantam no púlpito para defender o seguimento fiel do legado de Jesus quando se contesta hoje nas ruas seus ensinamentos. Se as igrejas se unissem no plano das ideias e dos postulados bíblicos, tal decisão mudaria tudo. Se separadas, são fracas, litigantes elas não representam nada. Os cardeais, os arcebispos, bispos, pastores, apóstolos, sejam quais forem os títulos das denominações devem se unir, na hora premente e presente, para reencontrarem o eixo, a verdade, a razão e o caminho.

Sentados à mesa, devem ficar, iguais a Jesus quando instituiu na santa ceia a eucaristia. Com o exemplo oferecerão ao país e ao mundo um conteúdo realístico de adesão a Deus. É possível a unicidade: segui-lo por caminhos eclesiásticos diversos. Os aspectos e matizes do serviço a Jesus Cristo para o reino de Deus, é único e básico para todos. Neste momento crucial, em que periga a fé – com tendência a piorar – é imperativo assumir sua defesa. Seguir Jesus, defende-lo, significa eliminar a descriminação. Fazer nosso, o cristianismo – sem barreiras fronteiriças – o seu projeto integrador e includente de construção de pontes, sem conviver com mentalidade de seitas. Dos congressistas brasileiros, pouco ou quase nada se deve esperar. O papel de postular, de rebater, de se contrapor ao ilícito, cabe mesmo as igrejas que professam e crêem no Pai, no Filho e no Espírito Santo. Se são três numa só pessoa, porque não uma vintena de igrejas num só ideal, sem perda da contextura de cada uma, no instante em que as luzes do mundo novo tendem a se apagar! 

O propósito fundamental desse texto, neste final de ano, é sugerir uma reflexão um caminho pelo qual as igrejas cristãs possam inaugurar os primeiros passos em direção ao mistério da aproximação histórica, por mais difíceis que sejam os obstáculos. Comunidade cristã nenhuma pode ser empresa, nem exercitar-se como tal. No plano das idéias e dos postulados cristãos quando ameaçados, é possível a união em torno da mensagem do Mestre. Jesus amparou pecadores de todo gênero, publicanos, eunucos e prostitutas, sem discriminar ninguém. Instruiu aos seguidores para que fizessem o mesmo. Quando se trata de desrespeito a Bíblia e as leis vigentes no país, as igrejas devem se fortalecer, advogar fielmente os propósitos das Escrituras. Hoje, correntes sociais se organizam, invadem, depredam, tudo para defender reivindicações políticas, futebolísticas, culturais, comportamentais, profissionais e sexuais, etc. Mas, não é crime agredir a Deus, difama-lo publicamente. Tudo cai na vala comum do direito ou opção individual de cada ser. Agridam Maomé, no mundo mulçumano, pra verem a reação? Apesar das diferenças de raça, culto, civilização e raízes culturais. O respeito às instituições valem mais. Jesus em Mateus: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo. Porque o meu jugo é suave e meu fardo é leve” (Capítulo 11, versículos 28, 29 e 30). Feliz Ano Novo!

(*) Escritor.

quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

 




CARTAS DE COTOVELO - VERÃO DE 2022/2023 - 1

Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes

            

Acabo de chegar ao meu ninho de repouso - Cotovelo e, ao ligar a televisão para testar o meu aparelho de TV, me deparo com a triste notícia da morte de Edson Arantes do Nascimento - PELÉ, jogador inigualável, que guardo na minha mente desde a sua estreia no histórico campeonato mundial de 1958. Nunca o perdi de vista. E estava orando para que Deus desse a ele o melhor caminho para o desfecho de sua vida.

            Há poucos dias tive a oportunidade de escrever um artigo sob o título: MEUS ÍDOLOS ESTÃO PARTINDO, onde lamentei a perda, em curto espaço de tempo, de amigos/amigas em variados campos da cultura e da vida.

            Agora, no findar deste não muito promissor de 2022, temos esse novo desfalque para o futebol brasileiro, deixando um vácuo que dificilmente será preenchido neste milênio, pois a tecnicidade no esporte chegou a um nível tal, que está perdendo o encanto da espontaneidade, da naturalidade e da singeleza.

               Sei que outros craques virão, mas a essência da grandeza de um Pelé ou de um Carlitos, não acredito que seja repetida.

  Tenho pouca esperança, que tenha o ensejo de assistir outro Campeonato de Futebol - isso é decisão do Criador, mas ainda que isso seja possível, não vou encontrar outra figura emblemática como o nosso Deus do Futebol.

                  Resta-nos guardar a sua memória de grande profissional, cidadão, e patriota, promovendo uma despedida inesquecível para perpetuar na história do esporte bretão - que um dia existiu no mundo um menino brasileiro, de origem pobre, afrodescendente, que chegou aos píncaros da glória, sendo merecedor da coroa de louro e, também de ouro, para gravar a sua eternidade de existência nos que tiveram o privilégio de conhecê-lo.

 

 

Viver

 

Berilo de Castro

A vida nos traz momentos de alegria, de felicidade, de paz, como também de tristeza, de sofrimento e de depressão. Não poderia ser diferente. Ela (a vida) gira como um carrossel no parque da existência humana.                         

Há momentos felizes e tristes, todos eles com início, meio e fim. Ninguém escapa, ninguém foge deles.

O isolamento social, o avançar da idade, a falta do que fazer pesam muito, e em certos momentos podem chegar à tristeza e à solidão, mas nada que não possam ser administrados, dominados e vencidos. É preciso, sim, coragem e enfrentamento.

São momentos, muitas vezes, inesperados. Na verdade, somos seus alvos centrais. Não escolhemos o momento exato de assumi-los e absorvê-los.

Chegam sorrateiramente e, na maioria, em ocasiões inesperadas e de incertezas.

À medida que envelhecemos, passamos a ficar mais vulneráveis; a solidão passa a se aproximar e fazer morada ao nosso lado; o ócio é danoso, não salutar e angustiante; é aí que a depressão pede passagem, provoca e nos povoa. E, assim, se inicia o caminho, e se constrói a estrada para aqueles que se entregam e se alinham nessa vereda triste e melancólica que é a depressão.

É preciso reagir e vencer esse mal milenar, cada vez mais vivo e ameaçador nesse mundo globalizado de hoje. Vamos à luta, afastar e vencer esse embate cruel que crucifica a vida.

A vida precisa e deve ser vivida em sua plenitude, em todas as suas fases e etapas com alegria e desprendimento. Não se justifica o sentido inverso.

Vamos viver felizes, cada dia, cada minuto, cada segundo como se eles fossem os derradeiros. A vida é uma passagem curta, sem parada e sem volta. Aproveitemos enquanto o trem não para.

 

O SONHO DO POETA

 

                                               -  Horácio Paiva*

 

                        Há na poesia do saudoso amigo e poeta Gilberto Avelino, que releio neste Natal de 2022 (vinte anos após sua morte), a sensação de profundidade espiritual, de evocação de instantes perdidos, porém magicamente recuperados na memória lírica.

 

                        Recordo o nosso último encontro pessoal, em nossa querida e lendária Macau, centro do mundo, porto a que sempre ancorávamos em nossas divagações existenciais. E isto, certamente, mais uma vez nos colocava em harmonia com a eternidade.

 

                        Mas não sabíamos que ali havia, também, uma despedida, um adeus, já que logo, em 21 de julho de 2002, o poeta faleceria. E vivemos aquele encontro na plenitude da poesia e do trabalho profissional.

 

                        Chegara à sua casa da Rua Pereira Carneiro às nove horas do dia 17 de julho, uma quarta-feira, e a encontrara iluminada com a sua alegria.

 

                        Gilberto, embora muito bem humorado, estava ansioso por revelar-me um sonho que tivera na noite anterior e, antes da leitura de seus novos poemas, passou a narrá-lo. Contou-me que tivera um sonho impressionante com o meu pai, Horácio de Oliveira Neto, já falecido. Durante toda a noite sonhara com ele, nos velhos tempos da agitada política macauense. E este, insistentemente, chamava-o: “Preciso de sua assessoria, com urgência, aqui.” Ao que respondia o poeta que logo iria, assim que concluísse determinado trabalho.

 

                        Gilberto admirava o meu pai, o seu caráter, a sua idoneidade, a sua coragem pessoal. Ingressara na política macauense através dele, ainda muito jovem, acadêmico de Direito. Prestava-lhe preciosa ajuda, com o seu talento e habilidade, porque acreditava nele e o julgava o mais apto para administrar Macau.

 

                        O escritor argentino Jorge Luis Borges, em seu “Libro de Sueños”, narra inúmeros e impressionantes sonhos de vultos históricos, sem adentrar-se em interpretações. Ali há relatos magistrais de sonhos de  Nabucodonosor, Jacó, José, Salomão, Confúcio (que sonhara com a própria morte), Cipião, Coleridge, Abraham Lincoln, dentre outros.

 

                        Eu e Gilberto também não nos fixamos em interpretações e, logo após a sua curiosa narrativa, passamos a outra modalidade de sonho: a poesia. Em seguida, o labor profissional da advocacia consumiu o restante do dia, para sempre memorizado.

 

                        Mas não quero terminar sem antes pôr em relevo a beleza e a lúcida singularidade desses versos do grande lírico espanhol Juan Ramón Jiménez, que tanto falam ao meu coração:

 

“Como aprendemos a morrer em ti, sono!

Com beleza magistral

nos vais levando  -  por jardins,

que parecem cada vez mais nossos  -

ao conhecimento profundíssimo da sombra!”

 

                        Relembro a nossa profunda amizade, que a morte não acabou, as nossas conversas infindáveis, as nossas divagações sobre política e projetos para Macau, sobre literatura, sobre o amor, sobre Deus. Relembro quando dizíamos que, assim, conversaríamos eternamente.

 

                        Macau e a poesia não perderam: ganharam Gilberto.

 

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(*) Horácio de Paiva Oliveira  -  Poeta, escritor, advogado, membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN, da União Brasileira de Escritores do RN e presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

 

A  antecipação no futebol

BERILO DE CASTRO

Tenho ativamente acompanhado o futebol nacional e internacional. Faz parte do expediente de um aposentado caseiro.

Como ex-atleta, tenho e sinto minhas alegrias e minhas frustrações, claro!  Me considero, de uma certa forma, um exigente e “chato” quando analiso uma partida de futebol, principalmente agora, quando vejo que ali estão os “abençoados” que recebem oceanos de euros (os super valorizados e não tanto justificados).

Tenho observado e dedicado maior atenção às ações do sistema defensivo das equipes; até pelo fato de ter sido um jogador defensivo.

Hoje, o futebol, na exigência dos seus treinadores e do próprio momento atual, não admite mais um sistema defensivo com jogadores de meia estatura (digo, de meia estatura, baixa, nunca!). Tudo bem, é óbvio! Então, vamos encher de “galalaus” as áreas defensivas. No entanto, existe uma coisa muito simples na prática do futebol: o chamado “fundamento”. O bom futebol é praticado tão somente em cima de uma boa e perfeita aplicação de seus fundamentos básicos.

Não adianta uma equipe ter em seu sistema defensivo jogadores de grandes estaturas, se esses não souberem e não praticarem o exercício do bom tempo de bola, aquele bendito e correto momento de chegar primeiro – a conhecida “antecipação”. Cito um exemplo típico e muito bem lembrado e praticado pelo excelente defensor da seleção paraguaio Gamarra e do Flamengo, carioca; de pouca estatura, mas de um senso de antecipação nunca visto, impressionante! E tem mais, sem cometer infração alguma. Foi bonito ver atuar!

Infelizmente, hoje pouco se pratica esse importante e eficaz recurso técnico, e quem agradece de coração feliz e pernas livres e soltas são os atacantes, que passaram a marcar muito mais gols.

 

sábado, 24 de dezembro de 2022

 

          



 

Versos minúsculos (carlos para therezinha)

na lembrança - a tristeza,

que trago nas lendas,

que guardo nas fendas,

da minha natureza.

 

um sonho distante,

daquela criança em flor

indiferente à dor

escrava e senhora num só instante

 

aqui estou na vã espera,

com o coração fora do peito,

amargando o findar daquele amor perfeito,

triste contraste nesta vida de quimera.

 

até quando guardarei, deserta,

na minha solidão infinda,

esperança de vê-la, desta dor liberta.

 

Enfim, nestes versos desbotados,

na vida sofrida, que continua

sem ver ou ter a imagem tua.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

 

SÍNTESE DE UMA VOCAÇÃO

 

Valério Mesquita*

Mesquita.valerio@gmail.com

 

O colega acadêmico padre João Medeiros Filho é do sertão, lá de Jucurutu, onde, Deus o sustentou na fé desde que nasceu. Sempre, manteve reflexões espirituais diante dos fatores imanentes e iminentes da vida. 

É um simples, não gosta de reuniões onde desfilam egos inflados. Suas crenças básicas estão fincadas na desafetação da vida como perpétuo e inalienável direito de existir, misturado ao povo miúdo, imagem e semelhança do Cristo, seu irmão. Nunca exercitou artificial adesão ao modismo litúrgico, plástico, aeróbico, difuso e mítico. No altar do Senhor ele é o donatário da capitania de Jesus ou capataz dos mistérios circundantes da fé. A sua homilia contêm a alma e o sumo das descobertas, interpretando em Mateus, persegue pontualmente os significados, a Lucas, Marcos, João e Paulo, tudo que o Espírito Santo falou. O padre apenas humana palavra necessária que todos queremos ouvir. No altar, nos repassa a unção e a certeza de que Deus existe.

A sua vasta experiência em vida acadêmica, direção e assessoramento superior em inúmeras instituições de ensino público e privado, oferecem-nos uma exata dimensão de sua experiência administrativa e cultural em cargos que ocupou.

O mais importante é que, com ele aprendi que soube sempre viver a alegria de sua pobreza material, território dos seus vãos e desvãos. Aqui e acolá fantasmas líricos apareceram para testemunhar o seu caminho de retidão. Triunfou sobre tudo, porque a sua angústia factual como sacerdote reside na tristeza de que o ser humano coisificou-se. Muita gente, perdeu a densidade, a identidade, a musculatura dos gestos e dos passos que fazem realmente a história da humanidade comum.

Nessa longa trajetória, sempre combateu o bom combate e nunca perdeu a lâmina da alma. Na atividade bibliográfica o seu labor foi extenso e genuíno nas origens e nas vertentes. Dos vinte livros publicados, três deles em idioma francês, versaram sobre temas sociais, religiosos, memorialísticos, históricos, publicados por editoras de prestígio nacional e internacional.

No céu estrelado de nossa amizade pessoal e litúrgica, ela passeia pela nostalgia que provém das nossas heranças telúricas de um tempo que a memória ainda não desfez. Juntos abominamos a marginalização dos pobres deste mundo que são hoje os mártires de ontem. Unidos, ainda procuramos nas conversas a terra habitada pelo silêncio e pela distância das coisas, porque o nosso grito é cárcere privado e já não se faz pouco ouvido, nesse mundo de contradições de todo o gênero. Vejo-o e sinto-o ainda, até hoje, moderado e modesto como sempre o conheci. Tão sem vaidades que gosta de ser anônimo, fulano de um mundo diferente, distante, coletivo. Em Emaús, onde Jesus mandou Nivaldo Monte deixá-lo, ele sonha com as madrugadas de silêncio, como se estivesse numa pracinha do interior, povoada de alegrias simples de viver.

O que gosta mesmo é de conviver ao lado da gente simples, muito humana, que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleito antes da hora, e nem foge de sua mortalidade, tal como pensou e escreveu o grande Mário de Andrade. Ele ama a solidão consentida para ouvir e falar melhor com Jesus. Vez em quando, de Emaús em Parnamirim, vem a Natal para rezar missas gratuitamente e rever amigos. Está consciente que completa mais um périplo em torno do tempo, sem nunca haver desamado os frutos de sua vocação. João Medeiros guarda em si a beleza aflita dos despossuídos. Um salmo invisível resplandece sempre em seus gestos e movimentos cadenciados de humildade cristã. Eis a minha homenagem.

 

(*) Escritor.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

 

DE POETAS LATINOS

 

                                    Horácio Paiva  -  Poeta*

 

Gosto dos clássicos e sempre os visito. Na paz deste Natal, isolado em “meus Montes Sabinos”, que transporto do histórico Lácio para a beleza agreste de Taipu, na Vivenda da Conceição da fazenda Lagoa Nova, releio Horácio, Vergílio, Ovídio, e navego Odes, Bucólicas e Arte de Amar. Depois, sonhando sem dormir, entrego-me a vigília amorosa e indispensável, a Pervigilium Veneris, ou seja, a Vigília de Vênus, deusa do Amor. Sim, pois “homo sum; nihil humani a me alienum puto” (“sou homem; nada do que é humano a mim é estranho”), como dizia Terêncio e repetia meu professor de latim, ao que acrescento: sobretudo a paixão. E, grato como costumo ser, mais uma vez agradeço a emoção, a fantasia e o prazer estético que me traz a poesia clássica, rica herança que recebo desse histórico trio de mestres da harmonia e do verso, ilustres representantes da chamada época de ouro da poesia latina (século I, a.C., a século I, d.C.). E enquanto me visita a Antiguidade, no recolhimento deste refúgio rural onde me encontro, na companhia da noite e de cécubo vinho, anoto ao acaso essas breves amostras retiradas das obras-primas revisitadas e as repasso, com o prazer sem pressa de quem presenteia (sim, isto mesmo, com a aliteração que o humor torna proposital):

 

da Ode 11, Livro I, das “Carmina” de Horácio (na minha tradução):

 

“Não indagues (ímpio é saber), ó Leucónoe,

Qual fim reservarão, a mim ou a ti, os Deuses

(...)

Sê sábia, o vinho decanta e ajusta

A longa esperança à vida breve.

Enquanto conversamos, foge invejoso

O tempo: colhe o dia de hoje, crendo

O mínimo possível no amanhã.”

 

Do poema 1, das “Bucólicas”, de Vergílio (na tradução de Zelia de Almeida Cardoso):

 

“Todavia, tu poderás descansar esta noite comigo

Sobre uma folhagem nova. Tenho frutas maduras,

Castanhas assadas e fartura de queijo;

Os telhados das casas já estão fumegando, ao longe,

E as sombras caem mais alongadas do alto das montanhas.”

 

Da Arte de Amar, I, de Ovídio (na tradução de Anna Lia A. de Almeida Prado):

 

“Se alguém neste povo não conhece a arte de amar,

Leia este poema e, tendo-o lido, já instruído, ame.

Pela arte os céleres barcos com a vela e o remo são movidos,

Pela arte leve é o carro. Pela arte deve ser regido o Amor.”

 

“(...) a mim cede o Amor, embora fira com o arco

Meu peito, agite e lance suas tochas.

Quanto mais me feriu o Amor, quanto mais violento me queimou,

Tanto mais vingador eu serei da ferida feita.”

 

“Nós, a Vênus sem riscos, os segredos permitidos cantaremos,

E no meu poema nada de censurável haverá.”

 

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No mais, é lembrar que Vênus faz sua vigília... na eternidade. E, na “Pervigilium Veneris”, um belíssimo anônimo latino, essa eterna vigília se encontra... e nos encanta, nesse bordão, aqui no meu jeito de dizer em português:

 

“Amanhã deve amar quem nunca houver amado,

E quem já houver amado, amanhã deve amar.”

 

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Há também outros, vários outros, todos bons, certamente direis, que foram capazes de ouvir estrelas e derramar seus eternos e encantados segredos sobre nós, e que poderiam participar deste sarau... E  disto são exemplos Propércio, Tíbulo, Marcial, Ausônio, Sulpícia, Catulo.

 

Há mais, mas por enquanto, separo dois destes já citados: Sulpícia e Catulo.

 

Sulpícia, única representante feminina nesse grupo e uma das poucas mulheres da Antiguidade a deixar uma obra poética, é tida como autora de seis poemas curtos, mas significativos, o que lhe garante presença permanente no Parnaso da poesia latina. De suas Elegias (Elegia III) são esses versos, traduzidos por Zelia de Almeida Cardoso:

 

“Finalmente o amor chegou e seja eu mais conhecida

Por tê-lo encoberto por pudor do que por tê-lo revelado a alguém.

Comovida por meus versos, Citereia o trouxe

E o depositou em meu regaço.

Vênus cumpriu suas promessas. Se alguém, ao que se sabe,

Não encontrou alegrias, que fale das minhas.

Não gostaria de confiar alguma coisa a tabuinhas seladas

Para que ninguém a lesse antes de meu amado;

Alegro-me de meu erro; aborrece-me fingir por minha reputação.

Que se diga que eu fui digna com um homem digno.”

 

Quanto a Catulo, sua importância é inegável e, sua posição, pioneira nesse cenário de estrelas, pois anterior àquela mais famosa tríade do período áureo da poesia lírica romana (Horácio-Vergílio-Ovídio). Suas “Carmina” (musicadas pelo alemão Carl Orff, um dos mais destacados compositores modernos do século XX) são belíssimas e um convite permanente ao amor e à sensualidade. Vejamos a de número 5, na tradução do professor Lauro Mistura:

 

“Vivamos, minha Lésbia, amemo-nos,

E a todas as censuras de velhos

Demasiadamente austeros

Demos o valor de um único asse.

Os sóis podem se pôr e retornar;

Quando porém numa única vez a breve luz

De nossas vidas desaparece no ocaso,

Somos obrigados a dormir uma noite sem fim.

Dá-me mil beijos, depois cem,

A seguir outros mil e mais cem

E depois ininterruptamente outros

Mil e mais cem.

A seguir, depois que tivermos trocado

Estes muitos milhares de beijos,

Alteraremos a soma deles para que

Não saibamos quantos foram ou

Para que nenhum invejoso possa nos

Lançar um mau-olhado quando souber

Exatamente o número destes beijos.”

 

“Da mi basia mille, da mi basia, ...” Poema sonoro e apaixonado, e tal sonoridade, capaz de inspirar Carl Orff em sua peça musical, associada à exaltação sentimental também me serviu de inspiração ao escrever meu poema “Noite Íntima”:

 

“Na estrada de penas e dores

o que me redime

senão a memória

de teus beijos musicais?

 

beijos que ainda

ditam meu voo

como sinos do amor que do passado

se tornam imortais”

 

No mais, Musa, no mais, que a lira desfalece e a voz embarga no imaginário de tantos beijos. Os demais bardos trarei em nova amostra, pois, na Arcádia, a noite é d’água, o pau flora e as Plêiades (Setestrelo, entre nós, com suas estrelinhas que povoam a mística sertaneja} já se escondem entre as nuvens.

 

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(*) Horácio de Paiva Oliveira  -  Poeta, escritor, advogado, membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN, da União Brasileira de Escritores do RN e presidente da Academia Macauense de Letras e Artes – AMLA.

 

 

 

Nélida Piñon e Clarice Lispector

Daladier Pessoa Cunha Lima Reitor do UNI-RN

 

A escritora Nélida Piñon, que faleceu em 17 de dezembro de 2022, era grande amiga de Clarice Lispector, falecida em 09 de dezembro de 1977. Lá, na eternidade, como foi esse encontro? Ou melhor, esse tipo de encontro existe? Tudo sugere que o mundo espiritual é difuso, ambíguo, fora de qualquer semelhança como mundo vivo. No livro Filhos da América (2016), Nélida Piñon, no ensaio Senhora da Luz e da Sombra, refere-se à amizade mantida, por muitos anos, com Clarice Lispector: “Escolhemos a amizade, que logo nos uniu, como modelo de desenvolver a crença na lealdade, no porvir, na convicção de que valia a pena estarmos juntas, rirmos juntas, chorarmos juntas. (...)Clarice era assim, ia direto ao coração das palavras e dos sentimentos. Conhecia a linha reta para ser sincera”. Nesse mesmo ensaio, Nélida Piñon revela o instante em que Clarice Lispector se despede da vida: “Quando o arpão do destino, naquela sexta-feirade1977, atingiu-lhe o coração, às 10h e 20 min da manhã, no Hospital da Lagoa, paralisando sua mão dentro da minha. (...) No entanto, a história da amizade se tece com enredo simples. Tudo predisposto a dormir na memória e pousar no esquecimento. Até que uma única palavra dá vida de novo a quem partiu de repente.” Clarice nasceu em 1920, e Nélida em 1937, 17 anos a diferença. Mesmo com idades tão distintas, formou-se uma forte e sincera amizade entre as duas, na qual “não havia lugar para exegese”. Vejamos esse trecho de Piñon, ao se referir a Lispector: “Mulher de elevada intuição, agindo como se tivesse a mão de Deus sobre os ombros, a conduzir-lhe o verbo e os passos, terá previsto, quem sabe, que aquela jovem sorridente, que se dizia escritora, haveria de acompanhá-la até o fim. Viveriam ambas uma amizade sem fissuras e defeitos.” Em outra parte do ensaio, Nélida Piñon fala da necessidade de ambas persistirem no amor ao ofício de escrever, até para não sucumbirem aos obstáculos próprios à arte da criação, além das barreiras às mulheres brilharem no âmbito restrito dos grandes escritores. Transcrevo as palavras registradas pela maestria de Nélida Piñon: “Ao longo de 17 anos, falávamo-nos diariamente. E lhe agradava dizer que eu, diferente dela, era uma profissional. Uma classificação que eu recusava em defesa do amor incondicional que sentia pela arte literária. Afinal, tanto ela como eu não podíamos ignorar o quanto havia que persistir no ofício para não ser tragada pelos obstáculos inerentes à criação, sem mencionar o sistema literário que tudo fazia para dificultar o desabrochar de uma pena de mulher”. Anos depois da morte de Clarice Lispector, sua grande amiga Nélida Piñon, da Academia Brasileira de Letras, declarou que, após falecer, é comum que famosos escritores fiquem no esquecimento por muito tempo, ou seja, “caiam no limbo”. Porém, com Clarice Lispector ocorreu o oposto, pois essa escritora, que faleceu em1977, a cada dia que passa, desperta mais a atenção de incontáveis leitores ao redor do mundo, pois suas obras já foram traduzidas em vários idiomas. Esta crônica é uma singela homenagem à escritora Nélida Piñon, que zelava com ternura seus vínculos com a Galícia, e nutria uma paixão pela língua portuguesa: “E faço da língua lusa a chave com que abro o cofre do mundo”.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

 

AMANHÃ, O ADEUS DA PRIMAVERA.
Primavera candente,
Buquês se desfazem, pétalas amarelam!
A chuva, vilã ausente,
A cinza foge da mata, os deuses apelam.
Finas veias no fundão,
As abelhas morrem de sede, travessia!
Cacimba seca, Sertão.
Morre o belo, vida, a natureza em razia.
A alma sertaneja treme,
O banzo não rima mais, desesperança!
Um cenário penitente!
O sol lutando só, abrasador, desencanta.
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