terça-feira, 16 de setembro de 2025

 Um país gravemente enfermo 

Padre João Medeiros Filho 

O Brasil contamina-se cotidianamente com polêmicas, intransigências, radicalismos e interesses meramente ideológicos ou partidários. Acarreta desgaste e desperdício de energias para os cidadãos e a sociedade. Por preconceito político ou partidário desprezam-se oportunidades ricas de diálogos construtivos, capazes de contribuir para a solução de muitos problemas. A dificuldade ou incapacidade de debater construtivamente tem revelado um despreparo para o exercício de responsabilidades civis, profissionais e até religiosas. Isso não é novo. Na época de Cristo, seus concidadãos viviam política e psicologicamente armados. A animosidade entre os habitantes da Judeia e Samaria, as diatribes entre fariseus, hipócritas, saduceus e outras seitas não são muito diferentes dos atuais embates no Brasil. Os quatro evangelhos estão repletos de alusões e exemplos desses confrontos (cf. Lc 9, 52-53; Jo 4, 9). Pode-se verificar um significativo descompasso entre as inúmeras possibilidades culturais, científicas, tecnológicas do Brasil contemporâneo e as contradições sócio-políticas do país. Este debilita-se paulatinamente com lutas fratricidas, causando impacto sobre diferentes atividades. Disso resulta uma fragilidade crescente das instituições, cada vez mais desacreditadas e desrespeitadas. Na carência de equilíbrio jurídico, ético e político, falta clareza às pessoas. Desse modo, prevalecem os conchavos, as narrativas e conveniências que produzem descompassos e dificultam entendimentos. Nesse contexto, a capacidade de diálogo se enfraquece, comprometendo a percepção da verdade e o exercício da solidariedade. Entendimento, acordo ou consenso parecem banidos neste país. O outro passa a ser inimigo, e não apenas umdissidente. É umretorno ao pensamento de Jean-Paul Sartre: “O inferno são os outros.” Atualmente, a pátria e os cidadãos se retroalimentam patologicamente de polêmicas e antagonismos. Não se informa mais com objetividade e razoabilidade. Joga-se querosene na fogueira. Hoje, as pessoas – inclusive governantes – tornam-se incapazes de aceitar, sequer ouvir críticas que ajudam a construir dinâmicas renovadoras dos diferentes contextos sociais. “Foi-se o contraditório, reina o ditatório”, já desabafava o jurista e senador Afonso Arinos, na década de 1970. Carentes de humildade, tangidos pela arrogância e empáfia, muitos se julgam melhores e “iluminados” do que são realmente. Hoje, a tendência é condenar açodadamente. Há pressa na emissão de juízos. Desconsideram-se as ponderações necessárias para interpretar adequadamente falas e fatos. Não se analisa o porquê das coisas. As sentenças são imediatas, impulsionadas por ódio, preconceito ou interesses mesquinhos. Por isso, opiniões e pareceres distanciam-se da realidade, prejudicando inúmeros processos importantes. São sintomas de obscurantismo e radicalismo. Portanto, as instituições não amadurecem. E, consequentemente, os acontecimentos são banalizados na velocidade própria das redes sociais, sem análise séria dos conteúdos e seus alcances. Valoriza-se mais o frenesi abusivo e alienante, ameaçando o equilíbrio mental e emocional do indivíduo e da pátria. Dentre as consequências desse cenário estão a ausência de habilidade para se relacionar e a crescente violência. O lar está deixando de ser o espaço das dinâmicas dialogais para se tornar palco de conflitos. “Muitos lares não passam de meros pensionatos”, afirmava Dom Nivaldo Monte. Isso contribui para o adoecimento da nação, agravado recentemente pela inépcia e falta de criatividade de certos administradores e o consequente colapso social. É preciso vencer as enfermidades morais e políticas que podem levar à depressão e derrocada social A desorientação generalizada é sinal de que o tecido interior da nação está roto. A dinâmica da fé é um pilar relevante para a existência. Jesus Cristo tranquilizou o leproso: “Levanta-te e vai. Tua fé te salvou” (Lc 17, 19). A recuperação da interioridade exige solidez da dimensão espiritual. Diante da crescente morbidade do ser humano, é prioritário buscar o fortalecimento da espiritualidade. A religiosidade integra também a terapêutica que restabelece a verdadeira dimensão humana. Ela contribui para que o sentido da vida seja percebido. As igrejas e religiões precisam oferecer abundantemente dinâmicas e vivências que venham a ajudar o Brasil a recompor sua interioridade. Atitudes renovadoras que possam contribuir para superar situações depauperantes, indiferenças comprometedoras da paz, disputas cegas e fraticidas. Como são profundas e reconfortantes as palavras de Jesus Cristo à samaritana! “Ah, se tu conhecesses o dom de Deus...” (Jo 4, 10).

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