segunda-feira, 11 de novembro de 2024
PRIVILÉGIO PANDEMIA E PANDEMÔNIO
Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com
A vida da gente, hoje em dia, chega a doer e a enjoar. Sobrepondo-se à lógica, aí estão os mistérios do mundo. Ele parece apodrecer cotidianamente. E acho essas razões um tanto metafísicas mas, perfeitamente racionais e cabíveis à espécie. Apesar da revolução das ciências, em todos os campos de atividade, há uma angústia indagativa porque tudo piora quando a humanidade progride materialmente. Muito antes, nas esquinas do mundo, a fatalidade das guerras ditadas pela imprudência interrompeu a esperança do ser humano no dia de amanhã. Tudo leva a crer, no crepúsculo dos nossos dias, que a escalada geométrica da dificuldade de se viver no planeta, hoje tão afetado pela superpopulação e a crise da falta de alimentos, remédios, é que ingressamos no corredor escuro do Armagedom.
A vida passa e diante dos nossos olhos segue um desfile barulhento de excessos. Excessos e abusos perturbadores provocados pelo braço do homem. Vejam só, por que surgem na atmosfera (o ar que respiramos) vírus gripais, infecciosos e contagiosos que se multiplicam e se transformam virando pandemia? No processo de mutação ultrapassam a eficácia da vacina e se propagam com surpreendente rapidez, induzindo-nos acreditar que a camada superior da terra e as defesas do corpo humano estão comprometidas por atos insanos do próprio homem. Os continentes, desde os mais industrializados aos mais pobres, desérticos, quentes, superpovoados, até as florestas tropicais em compasso progressivo de extermínio, incluindo os mares revoltos, revelam-me recôndita preocupação com o final dos tempos.
Igual em perigo à pandemia, mora vizinho o pandemônio. O tumulto do trânsito em Natal está trazendo estresse e hospitalizando muita gente. Avaliem as cidades maiores! Semana passada, entre 18h e 19h30, gastei de automóvel mais de trinta minutos do bairro de Lagoa Nova ao Natal Shopping. O número de veículos hoje na capital resgata a “saudade de mim mesmo”, como disse o poeta português. Esse grave fato estatístico não preocupa apenas pelo dano físico de acidentes, mas igualmente, pela nova geração de ansiosos, psicóticos e depressivos. E haja consumo de benzodiazepínicos. Diariamente em Natal, acontecem mais de 20 acidentes com motos. A malha viária não comporta mais o enxame de ônibus, “ligeirinhos” antipáticos e imprudentes, automóveis e utilitários de luxo, que lembram as mansões dos donos do tráfico de drogas.
Todavia, o pandemônio não se encerra aí. O assalto à mão armada não apenas reside ao lado, mas está dentro de casa fazendo reféns. Com armas modernas e de grosso calibre os marginais já são um número maior que o efetivo policial. Segurança no Brasil é uma ilusão congratulatória. Somente os bobos acreditam e agradecem. Ainda iremos assistir, se não planejarem logo uma solução, desfilando nas ruas e bairros as forças armadas do país, envolvendo-se na estratégia de resguardar a cidadania que é vida e que significa tanto quanto a defesa da soberania do país. Igual ou pior do que a invasão do território nacional é o lar ultrajado, violentado e saqueado da família brasileira que, no dizer de Rui Barbosa, “é a pátria amplificada”.
A corrosão cotidiana da busca pelo dinheiro e pelo poder enferruja com rapidez as “glórias e grandezas” de alguns que se julgam donos do mundo, quando pensávamos justos e coerentes. As mutações históricas dos valores da personalidade humana, ao que parece, foram provocadas pela “revolução” dos costumes sociais, principalmente o comodismo, a apatia pelo semelhante, o medo de morrer, as fobias e a falta de religiosidade.
(*) Escritor
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