Maio, a mitologia e a Virgem Maria
Padre João Medeiros Filho
Durante o mês de maio, a Igreja Católica cultua, de modo especial, a Mãe de Cristo e dos homens. Na primavera europeia, dentre as flores que desabrocham, estão as rosas. Partindo dessa realidade e de uma metáfora, a Igreja quis celebrar a beleza daquela que é a “Rosa Mística”, umas das invocações contidas na Ladainha Mariana. Justo e merecido é esse preito de gratidão à Virgem, modelo de vida cristã. Há outras razões históricas e mitológicas para as celebrações deste mês. Desde a Antiguidade, bem antes do nascimento de Cristo, o quinto mês do ano já era ligado a um personagem feminino. Seu nome é em homenagem a uma deusa da mitologia greco-romana, conhecida por Maia. Esta, segundo Junito Brandão e outros estudiosos do assunto, era a mais jovem das sete Plêiades, filhas de Atlas e Afrodite. Protetora do florescimento, Maia é associada à primavera, que atinge o seu esplendor no hemisfério norte, em maio.
No calendário civil, organizado por Rômulo na fundação de Roma (753 A.C), já havia ligação dessa época do ano com um arquétipo feminino. A constelação que mais se destaca nas noites de maio é justamente a de Virgem, com sua brilhante estrela Spica. Deste modo, o firmamento passou também a ser relacionado com uma figura feminina. Vale salientar que a constelação de Virgem já foi conhecida como Anna, a deusa do céu e esposa do deus sumério Anu. Outrora, tal astro também esteve vinculado a Deméter, divindade romana da agricultura e a Eva, esposa de Adão, de acordo com o relato do Gênesis.
Com o advento do cristianismo uma nova e excelsa mulher destacou-se: Maria Santíssima, a Genitora de Cristo. E assim, a veneração a Nossa Senhora veio preencher uma lacuna existente no catolicismo ocidental e oriental. Segundo a tradição cristã, o fato da Jovem de Nazaré ser filha de Ana (ou Hanna em hebraico), cujo nome está ligado à constelação de Virgem, contribuiu ainda mais para que se promovesse tal associação. Cabe ressaltar igualmente que, consoante a teologia católica, a Mãe do Redentor é chamada de nova Eva, reforçando essa analogia. Diga-se, de passagem, que no Evangelho de Lucas e na tradução da Vulgata, o anjo saúda a Virgem Maria com a palavra Ave, que é o inverso de Eva. “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo” (Lc 1, 28).
Conforme alguns pesquisadores, o calendário romano reformado por Júlio César em 45 A.C. (modificado pelo Papa Gregório XIII, daí o nome de calendário gregoriano), dedicava o quinto mês do ano ao deus Apolo, o qual recebeu de Hipérion o sol, a lua e a aurora. A lenda conta que Apolo matou uma grande serpente (Píton), que atemorizava o povo. A iconografia católica representa a Virgem Maria, nas pinturas e imagens de Nossa Senhora da Conceição, esmagando a cabeça de uma serpente, consoante também a descrição da Bíblia (Gn 3, 4-14).
Posto que a Mãe de Jesus é venerada pelos católicos como a Rainha do Céu, seu manto é representado pela cor azul do firmamento. “Ave, Regina Coelorum” (Salve, ó Rainha dos céus) é uma das antífonas rezadas ou cantadas, durante o ano litúrgico, no final das Completas, última oração da Liturgia das Horas, antes conhecida como Breviário Romano. Na Ladainha de Nossa Senhora (igualmente intitulada pelos fiéis católicos como Litania Lauretana) há uma invocação, reverenciando-a com o título de “Porta do Céu”. Para os cristãos que praticam o catolicismo, a Virgem Maria é o rosto materno de nosso Deus, “expressão terrena do feminino divino”, nas palavras do escritor e jornalista Luiz Paulo Horta. Deve-se venerar Nossa Senhora “Mulher, espelho de Deus”, no dizer poético de São Boaventura, lembrando que Ela exaltou os humildes e gerou o Salvador da humanidade. A Mãe de Cristo é “a Compadecida”, assim denominada por Ariano Suassuna. Como Rainha do Céu, torna-se nossa medianeira, qual seja, a “Onipotência Suplicante”, na belíssima definição de São Bernardo de Claraval. “Ó Maria, concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a Vós.”
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