terça-feira, 4 de abril de 2023

 

Para viver a Semana Santa

Padre João Medeiros Filho

No domingo passado, teve início a celebração da Semana Santa. Nela, acompanhamos a Paixão de Cristo, presente no calvário de tantos irmãos nossos. Talvez aflorem à mente dos cristãos apenas sentimentos de tristeza, dissabor e provação. Entretanto, não deve ser esquecido algo fundamental: Cristo derrotou a morte. Ao vencedor as palmas da vitória! Eis o prenúncio dos ramos, aclamando o Filho de Deus, como Rei e Senhor da História. Mas, “o meu Reino não é deste mundo” (Jo 18, 36), preconizava o Mestre. Muitos de seu tempo (como vários cristãos atuais) não compreenderam os motivos de sua condenação. Jesus abalou com sua doutrina e pregação as estruturas da sociedade onde Ele vivia. Representava uma ameaça aos que oprimiam o povo. E isto se repete até os dias de hoje, maquiado e latente em disputas políticas e ideológicas, no radicalismo em detrimento do bem comum. Cristo veio anunciar novos tempos (Ap 21, 5). “Mas, os seus não compreenderam” (Jo 1, 11). O Verbo de Deus quis habitar entre nós para proclamar o Reino da Justiça e da Paz. O Brasil caminha na contramão dessa realidade.

O Apóstolo Paulo pregou: “É preciso completar em nosso corpo aquilo que faltou à Cruz de Cristo” (2Cor 4, 10). “Ela representa a expressão da prepotência, má vontade e intolerância”, afirmara o Cardeal Cardijn. Deste modo, a Semana Santa não é somente a comemoração da Paixão do Senhor, como evento histórico. É também a reflexão sobre nossas angústias, dores, aflições e dificuldades. A população brasileira está sendo cada vez mais atingida pela ineficiência da saúde, educação, segurança e falta de emprego. Padece sob o peso do terror apregoado, da sombra da morte avizinhada. Isso dá-nos uma ideia do que vivemos na Semana Santa, ou seja, a via sacra cotidiana de nosso povo, assumida por Cristo numa demonstração de misericórdia e compaixão. Não esqueçamos sua advertência: “o discípulo não é maior do que o Mestre” (Mt 10, 24). Deste modo, poderemos percorrer o mesmo caminho. Somos o seu Corpo Místico, por isso atualizamos em nossas vidas o que acontecera, há mais de vinte séculos. 

Mas, não só de tragédias e fracassos é feita a existência humana. A Ressurreição de Cristo é a vitória sobre a maldade. Celebra-se no Domingo de Páscoa o triunfo sobre o pecado, isto é, o resgate humano concretizado. Cristo ressuscitou e já não morre mais! É imortal, por ser Filho de Deus, pelos seus ensinamentos perenes, sendo “Caminho, Verdade e Vida” (Jo 14, 6). Nesta Semana Santa sepultemos o egocentrismo, as polarizações, a polêmica deletéria entre os dignitários, os interesses sub-reptícios, enfim, nossos erros. É necessário haver uma Sexta-Feira Santa para cada um de nós, mormente no Brasil hodierno, buscando enterrar os descompassos individuais e coletivos a fim de preparar a Páscoa. A Paixão e a Ressurreição não são atos isolados, mas precedidos pela Quinta-feira Santa: celebração da fraternidade e da união. Existirá Páscoa, se houver comunhão, harmonia, diálogo e consenso. Este é um convite ao Brasil. Haverá Ressurreição, quando o amor se fizer presente.

No mistério da Semana Santa vivencia-se a resposta suprema de Cristo ao desafio permanente do Mal, que divide e separa, levando à fragmentação e destruição. Na Cruz se vislumbra a manifestação da ternura infinita de Jesus por nós. Na Semana Santa deste ano, vamos meditar também sobre a agonia de Cristo na realidade de tantas vítimas de uma pátria dilacerada pelo ódio e pela intransigência, rejeitando a fraternidade, conquistada pelo sangue de Cristo. Neste ano de 2023, Jesus revive a sua Paixão na insegurança, na penúria da saúde pública e na ausência de uma educação de qualidade, na tristeza dos relegados aos improvisos e desatenções de administradores e governantes. O Filho de Deus agoniza nos irmãos vítimas da corrupção, do descaso e conceito sofismado de vida, como se fora algo abstrato e irreal. Que haja Páscoa para todos, passagem do desalento para a esperança, da tristeza para a alegria, do fracasso para a glória! “Confiança, eu venci o mundo” (Jo 16, 33), assevera-nos Cristo, o vitorioso e Ressuscitado.

 

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