domingo, 23 de outubro de 2011


O MEU ALECRIM CENTENÁRIO
CARLOS ROBERTO DEMIRANDA GOMES, advogado, escritor e morador no Barro Vermelho

   Com alegria e emoção, vejo o bairro do Alecrim chegar aos 100 anos, com o qual convivo desde 1948.

Fui menino em suas ruas, nas andanças de bicicleta com meus diletos amigos Lula e Tico (Luiz Gonzaga Bandeira e Dr. Luciano Barros), nas andanças com Benivaldo Azevedo e Marcelo Moura, depois Paulo Oliveira, Emmanuel de Lira Freire, Airton Vasconcelos, Francisco Eider (filho de Mainha) e Geraldo Tavares.
Assisti muitos filmes no Cine Paroquial (depois Cine-Teatro Jesiel Figueiredo e, por fim, Cine Olde), no São Pedro e SãoLuiz – este o preferido por conta dos seriados nas sextas-feiras.
Lembro do bonde, que tinha terminal na Amaro Barreto, próximo aonde tem hoje o relógio do Rotary.

Fiz muitas compras na Casa de seu Genival Sarmento, nas farmácias Dutra e Navarro, quase vizinho do fotógrafo Jorge Mário, nas lojas de tecido e na Livraria (filial da Universitária). Lembro da tradição do Café Vencedor e Dois Irmãos e do Cuscuz da Mata, dos armarinhos "A Sertaneja" - Av. 1 e "Casa Azul" - av. 2.
Minha dentista – Raimunda Maria, ficava no Edifício Leite (De seu Leonel), jogava sinuca no Ed. de seu Manoel Leopoldo de Vasconcelos.
A Base Naval de Natal, erguida em 1941, mudou o cenário do bairro e era interessante assistir a grande movimentação quando jogava na avenida, após o expediente, algumas centenas de marujos.

Frequentei muito o Alecrim Clube da Av. 2, onde também ficava o Alecrim Futebol Clube, brinquei nas batalhas carnavalescas da Vila Naval.

Todos os meus filhos nasceram na Policlínica do Alecrim, que foi construída em 1934.

A maioria dos meus familiares foi sepultada no Cemitério do Alecrim.
Meus primeiros romances até o definitivo de mais de 50 anos, também no Alecrim.

Meus professores Evaldo Rodrigues (que publicou um livro sobre o bairro) e Luiz Gonzaga de Souza. No Alecrim atuaram, com brilhantismo, os Professores Saturnino, e o Patriarca, benfeitor do Alecrim Luís Soares. A Rádio Cabugi, pertinho da casa de Seu Bastos Santana (cercanias da Igreja de São Pedro)..
O Colégio das Neves e o Instituto Batista, o Grupo Jerônimo Gueiros, o João Tibúrcio e a minha costureira.D. Lica, mãe de D.Albertina.

Registro, ainda, os programas de auditório no Cine São Luiz, com Genar Wanderley, enquanto a Rádio Poti terminava a sua restauração, onde tantas vezes cantei ao lado de Elino Julião, José Filho e Laudicéia Paiva.

A sua data natalícia é 23 de outubro, como ensina o Mestre de Todos, o historiador e folclorista Câmara Cascudo, dando o cemitério público do Alecrim, como um dos marcos no surgimento de uma das mais tradicionais comunidades de Natal, resultante de um do surto de cólera, sendo entregue à população em 1856, pelo então presidente da Província, Antônio Bernardo de Passos. E isso foi feito 55 anos antes da inauguração oficial do bairro do Alecrim no dia 23 de outubro de 1911. Segundo o historiador Luciano Fábio Dantas Capistrano, “O Alecrim foi o quarto bairro a ser criado na capital Potiguar. Bairro de muitas histórias, sobre seu topônimo, conta Câmara Cascudo, tem sua origem no ato solidário de uma bondosa senhora, que habitava um humilde casebre, nas imediações onde hoje se encontra a Igreja São Pedro.
Pois bem, diz o mestre Cascudo, essa senhora ofertava a todos os cortejos fúnebres que passavam, enfrente de sua casa, ramos de Alecrim, arbusto abundante naquela região. Deste ato de compaixão humana, denominou-se Alecrim, esta região de Natal, que até meados da segunda década do século XX, era um lugar ermo, distante de tudo, região de sítios e granjas, lugar de morada do povo mais simples.” Segundo esse historiador, “Em 1911 o Pte da Intendência (antiga denominação da Prefeitura ), Joaquim Manoel de Moura, criou oficialmente o bairro do Alecrim e em 1947, durante a administração do prefeito Sylvio Pedroza , foram, finalmente regulamentados seus limites. Estas duas datas são, digamos, simbólicas.”´E um lugar de gente humilde e trabalhadora, forjada pela emigração de pessoas vindas do interior, que fizeram do Alecrim “o cais do sertão”, no dizer do escritor e professor Itamar de Souza..
Bairro comercial, o Alecrim oferece a todos a certeza de ali se encontrar tudo o que se pretenda comprar.

Como diz a poesia de Palmyra Wanderley, o Alecrim tem a marca de um povo alegre,

“É o bairro de samba, da folia,
Das adivinhações e da magia,
Das promessas de fitas,
Dos fandangos, dos leilões...
E das velhas latadas de maracujá,
Das modinhas antigas,
Cantadas nos terreiros lá de cima,
Ao som dos violões de acorde certo...”


Outra faceta do Alecrim é que ele se confunde com o movimento dos escoteiros, com a criação dos "Escoteiros do Alecrim", idealizado pelo gênio macaibense Henrique Castriciano,
criado e consolidado pelo Prof. Luiz Soares - seu Patrono, que se alojaram, por muito tempo, no então Grupo Escolar Padre Miguelinho. No Alecrim funcionou, por muito tempo, o “asilo dos loucos”, que incomodava os vizinhos e botava medo nos meninos que por ali passavam.
No passar do tempo foi criada a Paróquia de São Pedro, em 15 de Agosto de 1919, por Decreto de Dom Antônio dos Santos Cabral, então Bispo Diocesano do Natal, inaugurando-se a primitiva Igreja de São Pedro, construída pelo Padre alemão Fernando Nolte, .depois reformada no tempo do Padre Martinho, da Congregação da Sagrada Família. Os seus primeiros padres missionários chegaram ao bairro por volta de 1910 a 1912, segundo relatado no Livro Tombo da Paróquia, onde havia uma capela dedicada a São Geraldo, e os pastores ficavam com seus rebanhos para passar a hora do meio-dia sob a sua sombra. Recordo bem das minhas domingueiras na Igreja e São Pedro.

Foi no Alecrim autorizada a maior feira de Natal, ainda hoje funcionando, freqüentada por pessoas dos demais bairros, agora um tanto defasada com a era dos supermercados. Fui freguês da feira do Alecrim, fazendo percurso a pé, acompanhado de um balaieiro.
Estava então consolidada a importância social, religiosa e comercial da região que passou a ganhar a especial atenção dos gestores públicos e a preferência dos natalenses, como , também, um bairro atraente para os políticos,que realizavam os seus comícios e passeatas, com grande participação popular, sobretudo na Praça Gentil Ferreira, onde se apresentavam artistas afamados.

Outro aspecto interessante do bairro é a toponímia de suas ruas, conhecidas pela numeração das avenidas, de números 1 a 18, depois ganhando nome dos Presidentes de Intendência ou de Província, em decorrência de trabalho realizado pelo arquiteto GiácomoPalumbo, contratado pelo Prefeito Dr. Omar O´Grade - Avenida 1, Presidente Quaresma, em homenagem a Basílio Quaresma Torrão, que Governou de 1833 a 1836; Avenida 2, Presidente Bandeira, em homenagem a João Capistrano Bandeira de Melo, que Governou de 1873 a 1875; Avenida 3, Presidente José Bento em homenagem a José Bento da Cunha Figueiredo Junior, que Governou de 1860 a 1861; Avenida 4, Presidente Sarmento, em homenagem a Cassimiro José de Morais Sarmento, que Governou de 1845 a 1847; E a Avenida 5, Presidente Leão Veloso, em homenagem a Pedro Leão Veloso, que Governou de 1861 a 1863.

O bairro teve o seu historiador na pessoa do professor Evaldo Rodrigues de Carvalho, em seu livro "Alecrim ontem, hoje e sempre", de 2004, na condição de morador do bairro.
No cemitério do Alecrim repousam pessoas ilustres, como o único presidente República potiguar da história do Brasil: Café Filho, o soldado-mártir Luiz Gonzaga, morto na Intentona Comunista, o ex-prefeito “de pé no chão também se aprende a ler” Djalma Maranhão, o industrial João Severiano da Câmara, o pioneiro no processo de industrialização no Rio Grande do Norte, Juvino Barreto, como também Januário Cicco, fundador dos dois primeiros estabelecimentos hospitalares de porte em Natal, o poeta Henrique Castriciano, o historiador Câmara Cascudo e muitos soldados
americanos e alemães, mortos durante a Segunda Grande Guerra Mundial, ali existindo mausoléus conservados pela Liga Operária, Irmandade dos Passos e a Maçonaria e outros de Padre João Maria e de Pedro Velho.(Existe uma obra que trata exclusivamente das histórias do Cemitério, escrita por Yericê Duarte Cabral).

QUANTA SAUDADE!
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Créditos: fotos da Internet, site 'omelhordobairro.com', Canindé Soares, Elpídio Júnior e deste blog.

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